Quem esteve presente na Assembleia Nacional há 21 anos, quando os generais Armando da Cruz Neto e o malogrado Abreu Muengo ‘Kamorteiro’ selaram com um abraço forte o fim definitivo da guerra em Angola, jamais irá esquecer o que se passou.
Depois de mais de três décadas de conflito armado, entre irmãos, os angolanos podiam assim marcar um novo passo, em que desta vez não foi por conta das chancelarias europeias ou americanas, que ao longo dos anos funcionavam como uma espécie de mediadores dos acordos então rubricados entre o Executivo angolano e a UNITA, liderada por Jonas Savimbi.
Fracassados os acordos de Bicesse, por conta do recrudescimento do conflito armado, que permitiu a UNITA durante um certo período ter em sua posse uma parte significativa do país, a solução à africana em Lusaka andou tremida, apesar da criação do Governo de Unidade e Reconciliação Nacional. A dado momento, mesmo com deputados na Assembleia Nacional e integrantes do Governo, havia nas matas uma outra UNITA que continuava com as hostilidades militares até 2001.
Fossem respeitados os acordos anteriores, com certeza que se iria salvar inúmeras vidas, infra-estruturas e permitir que o país começasse mais cedo com o processo de reconstrução e reconciliação nacional. Mas assim não foi, porque teve que se recorrer à fórmula ‘fazer a guerra para acabar com a guerra’, uma posição que, apesar de difícil, dolorosa e contraria- da por muitos, acabou por surtir efeitos que levaram à morte de Savimbi e, consequentemente, o alcance da paz que hoje se vive.
Como se tem dito com regularidade, a paz não é só o calar das armas. É preciso que as pessoas sintam esta paz de várias formas, um desiderato ainda por se alcançar uma vez que ainda são visíveis inúmeras debilidades sobretudo para um país rico e tão cobiçado como é Angola.
Era expectável que nestes 21 anos de paz muito estivesse já debelado. É verdade, por exemplo, que conseguimos circular em todo o país sem os receios de que possamos ser atacados por algum grupo rebelde, mas as condições em que está a nossa malha rodoviária, em alguns pontos das regiões Norte, Nordeste e Leste em nada dignificam os angolanos, o que acaba também por encarecer a vida destes.
Quando se alcançou a paz, com a mão amiga da China que acabou por colmatar a não realização de uma conferência de doadores que serviria para ajudar o processo de reconstrução do país, um dos primeiros objectivos do Executivo, então liderado pelo Presidente José Eduardo dos Santos, foi melhorar a livre circulação de pessoas e bens.
Infelizmente, muito do que se fez no período da reconstrução nacional, naquela fase em que o país era, na realidade, um canteiro de obras, vai sendo perdido. Era expectável que duas décadas depois ainda tivéssemos as estradas funcionais, o que não parece possível devido à má qualidade técnica de alguns dos trabalhos que foram feitos e acabaram mais por enriquecer determinados indivíduos.
Nestes 21 anos de paz, sente-se que há ainda muito por fazer e alguns dos problemas herdados naquela fase continuam permanentes. É preciso que se faça sentir ao máximo os benefícios a todos os angolanos, começando por aquilo que parece mais básico. Como cantou o rapper angolano MCK, é preciso que se tenha também paz no prato.