Dois dias depois dos pronunciamentos do Presidente João Lourenço, no Estado da Nação, sobre as condecorações dos signatários dos Acordos de Alvor, ainda ecoam muitas vozes em relação ao que foi dito.
Para muitos, era quase certo que Jonas Savimbi e Holden Roberto não fossem reconhecidos pelo papel que desempenharam na luta de libertação nacional, assim como na implementação da própria democracia.
À medida que se escuta o que foi dito — e as reacções instantâneas, algumas até consentâneas —, dá para cogitar que a não entrega das referidas medalhas pudesse ser um grande activo político.
A mística da vitimização, que aos poucos se vai enraizando no seio da política angolana, tornou muitos políticos e forças políticas sérias disseminadores de ideias e pensamentos através dos quais acabam por obter ganhos políticos, não importando a forma.
É indiscutível que, no passado, quando se trouxe à baila a questão das condecorações, houve posicionamentos — incluindo no seio de políticos, simpatizantes e até membros de estruturas do próprio MPLA — que nem sequer admitiam que os dois antigos líderes pudessem merecer as honras agora anunciadas.
Tendo em conta as rivalidades políticas, ainda sentidas sem muito esforço, é normal que situações do género viessem a ocorrer. Mas nunca houve, por parte da própria estrutura política, ou seja, da sua direcção, orientações que parecessem indicar que tanto Jonas Savimbi como Holden Roberto não pudessem ser condecorados.
Nem tampouco do Executivo. O ministro da Administração do Território, Dionísio da Fonseca, salientou, em entrevista no início do processo, que não havia nenhuma proibição nesse sentido.
E prefiro acreditar que seja verdade. Afastada a hipótese de não serem excluídos da condecoração, que, em princípio, será em Novembro — por sinal, a data em que se assinalam verdadeiramente os 50 anos de independência —, o debate que se levanta agora é sobre o mérito, perdão, unidade e reconciliação.
Foram algumas das palavras apresentadas pelo Presidente João Lourenço. Porém, parece que só uma foi vista pelos críticos, e as demais, como unidade e reconciliação nacional, não interessam — o que acaba por levantar preocupações.
Embora se reconheça, indubitavelmente, o papel que os três subscritores de Alvor desempenharam para a independência do país, a participação de cada um na altura e a posição adoptada posteriormente merecerão sempre avaliações diferentes nos vários palcos da vida política e social angolana. Se, para uns, alguns deles são deuses, para outros serão sempre uma figura distante da divina.