Na semana finda, Angola foi palco do Congresso da Reconciliação Nacional, promovido pela Conferência Episcopal de Angola e São Tomé (CEAST). À primeira vista, tal iniciativa pareceu um acto nobre e oportuno. Contudo, a sua condução e composição suscitaram dúvidas quanto à sua verdadeira natureza: reconciliação no verdadeiro sentido ou mera encenação política? A forte presença de figuras ligadas à política, por si só, nada de mal teria, caso fosse equilibrada com a presença da comunidade teológica e académica em geral. Mas diante de tal cenário, contrário ao exposto, deu ao encontro um tom mais político-partidário do que pastoral. Faltou o essencial: a profunda reflexão, a escuta, a confissão, o perdão e o compromisso ético-moral – pilares fundamentais para a reconciliação genuína.
O ambiente pareceu mais um reencontro de antigos camaradas ideológicos do que a busca nacional pela cura das feridas do passado. Teologicamente, a reconciliação é uma missão espiritual, pois, desde os primórdios foi uma acção da iniciativa divina, a qual o mesmo Deus quer que os humanos a exercitem sem hipocrisia ou com parcialidade.
Nesta visão, Paulo escreve: “Deus nos reconciliou consigo mesmo por meio de Cristo, e nos deu o ministério da reconciliação” (2 Coríntios 5:18). As pessoas vocacionadas para esta nobre missão só têm de ter a vida ligada com Deus, no caso a Igreja. Significa que, se assim for, ela estará a exercer o seu papel sempre que se dispuser em realizar actividades que visem promover a sã convivência.
Tal cumprimento não se deve limitar numa realização formal, mas num espírito profético! Quer isto dizer, a Igreja, portanto, deve ser voz profética, chamando à verdade e ao arrependimento, e não perder tempo com discursos protocolares (que já são tantos e tediosos!); ela deve fazer diferente, não se calando diante da gritante carência de amor ao próximo, harmonia, justiça, paz espiritual e todas virtudes que constituem a vida em uma sociedade saudável. Quando a Igreja se cala ou se torna cúmplice do poder temporal, perde a sua autoridade moral e espiritual. Outro detalhe é relacionado à imprensa.
Curiosamente, parte da imprensa focou-se mais na ausência do Presidente da República, esquecendo-se que foi ele próprio quem iniciou passos concretos para a reconciliação, como a entrega das ossadas do líder fundador da UNITA, Dr. Jonas Savimbi e de outras figuras ligadas a este partido, e não só, bem como o processo do “Abraçar e Perdoar” que resultou na criação da Comissão de Reconciliação em Memória das Vítimas de Conflitos Políticos (CIVICOP), só para citar alguns.
O que se esperava do congresso era o aprofundamento espiritual desses esforços, e não a sua instrumentalização política. Falar de reconciliação nacional é incoerente quando, dentro dos próprios partidos e movimentos cívicos, a intolerância, o regionalismo e o preconceito prevalecem.
O caso do jovem Massanga, militante da UNITA, acusado de ser “candidato do regime” por manifestar vontade de concorrer internamente para a liderança do seu partido, ilustra a hipocrisia que ainda domina o nosso cenário sócio político. Faltar-nos-ia tempo de falar das intrigas, quase eternas, existentes no seio de vários outros partidos políticos e movimentos cívicos, desde a sua base ao topo, quer movidas por razões de querelas ou mesmo outros fins menos abonatórios para a construção de uma verdadeira nação.
Nas redes sociais, a situação é semelhante: quem pensa diferente é atacado e silenciado. Faltam-nos as culturas de tolerância, respeito, inclusão, empatia e afeição. O lema do evento “EIS QUE FAÇO NOVAS TODAS AS COISAS” (Apocalipse 21:5) é inspirador, mas ficou sem corpo espiritual, pois fazer todas as coisas novas requer arrependimento e perdão – não apenas discursos e fotografias. As imagens alegres do congresso parecem ter ficado na sala onde foram tiradas; foi uma idealização bem-intencionada, porém, sem eco na vida real.
O Congresso da Reconciliação teria sido um marco histórico, mas acabou parecendo apenas mais um exercício de retórica e nostalgia. A reconciliação que Angola precisa é de conversão nacional, de partidos e consciências. Só quando formos capazes de perdoar e acolher o outro com sinceridade, poderemos afirmar com verdade: “Eis que faço novas todas as coisas”.
Por: KATEVE BAMBI
Teólogo, TADS, Jurista









