A realidade do Cangundo, situada no município do Negage, província do Uíge, espelha o desafio de muitas comunidades rurais angolanas: um equilíbrio delicado entre a preservação das tradições e a luta pelo progresso. Entre campos agrícolas manuais, poços de ouro e o sonho de energia electrica e água constantes, o povo do Cangundo contínua firme, guiado pela voz do seu regedor, Manuel Bambi Castigo, símbolo de resistência e esperança
O sistema de água, parte do programa “Água para Todos”, é antigo, herdado do período colonial, com tubagem desgastada e tanques que dependem de motores para bombear a água do rio. A operação do sistema, no entanto, é dificultada pela falta de combustível, tornando o abastecimento irregular. Apesar disso, a população consegue consumir água canalizada, ainda que limitada, graças ao trabalho de um canalizador local que vai tentando solucionar as avarias na medida em que vão surgindo.
O regedor Manuel Bambi Castigo, conhecido simplesmente como soba Bambi, descreve a vida na comunidade como sendo relactivamente normal, embora a energia eléctrica, os serviços de saúde e a educação, bem como a falta de instrumentos de trabalho na agricultura incorporam o leque de dificuldades.
Sob a sua liderança, a localidade, composta por seis sobados, funciona como centro de administração tradicional, intervindo nos problemas locais e mediando a relação da população com à Administração Municipal.
Nos últimos anos, a comunidade enfrentou também o desafio da exploração ilegal de ouro, actividade que atraiu pessoas de várias regiões do país. A regedoria interveio para controlar a situação, limitando a exploração apenas aos moradores locais e removendo todos os elementos de fora, que representavam um risco potencial à segurança e à ordem.
A mineração tornou-se, sobretudo para a juventude, uma alternativa de rendimento, oferecendo oportunidade de adquirir motorizadas, rádios, móveis e outros bens. Ainda assim, o regedor reconhece que o controlo ainda não é totalmente eficaz, uma vez que outros elementos continuam a explorar de forma irregular, inclusive parentes que vivem fora da comunidade.
A presença da mineração trouxe, paradoxalmente, benefícios sociais, como a redução da delinquência. Segundo Bambi, o roubo de galinhas e cabritos, que era comum no passado, diminuiu consideravelmente desde o início da actividade. Os jovens, que antes enfrentavam escassez de emprego, passaram a ter uma fonte de sustento, o que promove mudanças visíveis na comunidade e gera esperança de maior autonomia económica.
O regedor destaca que, a par dos avanços pontuais, a comunidade clama pela intervenção do Governo e da Administração Municipal para superar desafios estruturais, especialmente no abastecimento de água e energia eléctrica. “A energia é o maior problema.
O povo depende do Governo e espera que o programa nacional de electrificação chegue à nossa comunidade”, afirmou. Além disso, Bambi reforça a necessidade de aumentar a produção agrícola e melhorar a infraestrutura para garantir melhores condições de vida.
A regedoria funciona com base nos sobados locais, que recebem e tratam os problemas da população. Quando uma dificuldade não pode ser resolvida localmente, o caso é encaminhado para a Administração Municipal.
O conselho de sobados actua de forma a manter a ordem e assegurar que as tradições locais coexistam com as necessidades do desenvolvimento moderno. Entre os desafios históricos e as limitações actuais, a comunidade do Cangundo mantém viva a esperança de evoluir economicamente, socialmente e educacionalmente.
A liderança do regedor, aliada ao esforço da população, reflecte um equilíbrio entre a preservação das tradições e a busca por progresso e desenvolvimento, ilustrando a realidade de muitas localidades rurais em Angola.
Saúde enfrenta desafios estruturais, mas mantém atendimento regular
O Centro de Saúde da comunidade actua como ponto de referência para atendimento médico em diversas áreas, garantindo serviços essenciais à população local. Apesar do funcionamento regular e da dedicação da equipa, o centro enfrenta desafios estruturais significativos.
Segundo o enfermeiro Miguel Paulo Bunga, destacado na unidade desde 2020, as chuvas intensas danificaram parte do tecto e há salas comprometidas, o que torna urgente uma reparação completa da unidade para garantir condições seguras de atendimento.
Em declarações ao jornal OPAÍS, reforçou a importância do apoio das autoridades para manter a qualidade do serviço. “Precisamos com urgência de reparações no centro, porque a estrutura já não atende adequadamente à população, especialmente em períodos de chuva”.
Mesmo com as limitações, o centro segue prestando serviços essenciais à comunidade, mantendo atendimento regular e garantindo que moradores tenham acesso à saúde básica, mostrando o compromisso da equipa em suprir necessidades locais com os recursos disponíveis.
O centro oferece consultas prénatais, planeamento familiar, pediatria, consultas externas para adultos e atendimento de pequenas urgências. O funcionamento ocorre de segunda a sexta-feira, das 8h às 15h, mas muitas vezes se estende até às 16h ou 17h, dependendo do fluxo de pacientes. Em casos graves, os pacientes são encaminhados para o hospital municipal, com apoio de ambulância.
Quando isso não é possível, os próprios pacientes assumem o transporte, garantindo o acesso à assistência. Entre as patologias mais comuns na comunidade estão a malária, gastroenterites, infecções de pele e ferimentos, muitas vezes resultantes das actividades diárias ou do contacto com lagoas e rios na região. Para o tratamento inicial, o centro dispõe de uma pequena farmácia, equipada com fármacos básicos que permitem atender a maioria das situações de primeira instância.









