Num tempo em que todos escrevem, todos opinam e todos publicam, torna-se urgente esclarecer, com serenidade e rigor, quem é realmente jornalista. A profissão não nasce de um mero desejo, nem de um telemóvel com internet. Nasce de um compromisso com a verdade, com a ética, com a integridade e com o serviço público. O jornalista é, antes de tudo, um profissional que entende que a informação é um bem público.
É alguém que sabe que cada palavra tem peso, cada frase tem impacto e cada notícia tem consequências. Não é apenas o que escreve, é o que verifica, o que confirma, o que questiona, o que duvida, o que investiga. Essa é a diferença entre relatar e simplesmente falar. Há quem tenha chegado ao jornalismo através da formação superior, com um curso estruturado que oferece bases teóricas e práticas sobre comunicação, ética, técnicas de reportagem e responsabilidade social.
Esta formação é valiosa e dá ao profissional um entendimento mais profundo sobre o que significa informar num Estado democrático. Há também quem tenha construído o seu caminho na prática, com anos de experiência em redacções, aprendendo com os colegas, com os chefes de mesa, com os erros, com a pressão e com a rua.
Muitos destes profissionais, apesar de não terem formação académica, carregam um conhecimento prático que sustenta redacções inteiras e que merece todo o respeito. Esses profissionais trazem experiência, sensibilidade e técnica adquirida com o tempo. Aprenderam a ouvir, a observar, a desconfiar, a interpretar silêncios. Conhecem as ruas como páginas abertas. Dominam o detalhe que faz a diferença numa grande reportagem.
A prática é uma grande escola. Mas existe ainda um outro grupo. Dos que confundem publicar com informar. O digital abriu portas, democratizou a voz, deu espaço a todos, o que é positivo. Porém, essa democratização não substitui a profissão. Ser influenciador, criador de conteúdo ou partilhador de opiniões não é ser jornalista. Informação sem verificação é opinião. E opinião sem responsabilidade é ruído.
O digital trouxe novos desafios. Hoje, quem tem um telefone sente-se repórter. As redes sociais democratizaram a voz, mas também confundiram funções. Muitos confundem visibilidade com competência. O algoritmo tornouse editor, e o aplauso virou critério. Mas jornalismo não se mede por likes. Os criadores de conteúdo têm o seu espaço, mas não são jornalistas. Falam de si, de moda, de viagens, de rotinas. Muitos são talentosos, mas não seguem o método. A informação que produzem não passa pelo rigor da verificação. É conteúdo, não jornalismo, e as diferenças são claras.
A fronteira está na verificação. O jornalista não publica sem apurar. Não transforma rumores em factos. Não distorce versões para agradar. Ele sabe que uma notícia maltratada destrói reputações, cria pânico e compromete a credibilidade da classe. Verificar é o coração do jornalismo. Já no digital, a velocidade tornouse inimiga da precisão. E é aí que o jornalista mostra o seu valor. Ele desacelera, confirma, analisa e só depois publica.
A sua missão é proteger a verdade num mundo em que todos querem ser os primeiros a falar. A prioridade dele é ser o primeiro a acertar. A verdade é que o jornalismo precisa dos dois caminhos. O académico e o empírico. Quando se unem, criam uma classe mais forte e completa. O problema surge quando se tenta reduzir o jornalismo a mero talento ou só a títulos. A profissão exige conhecimento, sensibilidade e carácter.
Por isso, a carteira profissional surge como um elemento distintivo e essencial. É ela que valida, legalmente, quem exerce a profissão. É o documento que atesta que aquele cidadão está sujeito às normas éticas, às leis da comunicação social, às responsabilidades de difusão pública e às consequências dos seus actos. Ter carteira não torna ninguém melhor, mas torna a actividade legítima.
Ter carteira implica compromisso com a verdade e respeito ao público. É aceitar a responsabilização por informações erradas, calúnias ou manipulações. A carteira protege o jornalista e protege o cidadão. Ela mantém a profissão organizada, valorizada e credível. Sem carteira, o risco de confusão aumenta. Qualquer pessoa pode publicar, mas nem todos podem informar. A profissão exige credibilidade formal.
A carteira garante isso. Ela é a linha que separa o jornalista do improvisador digital, do influenciador e do agitador. Por isso, jornalista não é apenas quem escreve. Não é quem lê bem, quem fala bonito ou quem tem muitos seguidores. Jornalista é quem assume a verdade como missão, a ética como limite e o público como prioridade. É quem sabe que a informação não é um palco, mas um serviço.
O jornalista tem limites claros, não inventa, não manipula, não distorce. Não usa a profissão para perseguir, nem para promover interesses pessoais. A ética é a bússola que orienta cada decisão. E quando falha, falha com humildade, reconhecendo o erro. A credibilidade é a sua maior riqueza. Constrói-se ao longo de anos e perde-se em minutos. Por isso, o jornalista é cuidadoso, transparente e disciplinado.
Ele sabe que o público confia nele, e confiança é algo que não se compra, conquista-se com trabalho sério e contínuo. O jornalista também é ponte entre o cidadão e o Estado. Traduz decisões, escrutina políticas, questiona autoridades. Ele explica o que está por detrás dos factos. Ele informa para que o público participe conscientemente da vida do país. Sem jornalismo, não há cidadania plena.
Num país em crescimento e desafios constantes, o papel do jornalista é ainda mais essencial. Ele é o guardião da transparência. Trabalha para que o cidadão não seja enganado, manipulado ou mantido no escuro. A informação é luz, e o jornalista carrega essa luz com responsabilidade. O jornalismo moderno é diverso. Abrange o repórter, o editor, o fotógrafo, o analista, o jornalista digital. Cada um contribui com um olhar único. A força da classe está na pluralidade. Mas todos têm um ponto comum, a ética. Sem ética, não há jornalismo, apenas barulho.
A tecnologia evolui, mas o essencial não muda. O jornalista continua a ser o profissional que dá sentido ao mundo. Ele filtra o excesso, organiza o caos e explica o que parece confuso. Num mar de informações, ele é o farol que guia o público, e fazer isso exige coragem. A coragem é parte da identidade do jornalista. Ele investiga temas sensíveis, enfrenta pressões, suporta críticas e mantém a integridade mesmo quando é mais fácil ceder. A coragem não é grito, é persistência.
É continuar a informar mesmo quando informar incómoda. O jornalista não trabalha para agradar governos, empresas ou massas. Trabalha para servir o cidadão.
A sua missão é pública, não privada. E essa missão exige independência. Onde há dependência excessiva, não há jornalismo, há propaganda. A classe jornalística precisa de respeito e reconhecimento. Mas esse respeito nasce da credibilidade colectiva. Cada jornalista que actua com ética honra a profissão.
Cada um que erra de forma grave mancha a classe inteira. Por isso, o compromisso precisa ser diário. No fim, jornalista é aquele que honra a verdade, serve o público e protege a democracia. É aquele que escolhe a ética, mesmo quando custa. É aquele que informa com rigor, mesmo quando é mais fácil inventar. Jornalista não é quem fala, é quem apura. Não é quem aparece, é quem serve.
Numa era de excessos, é importante reafirmar que jornalistas são necessários, insubstituíveis e profundamente relevantes para o país. A sociedade precisa deles. A democracia precisa deles.
E a verdade, essa eterna e teimosa verdade, depende deles para continuar a existir. O jornalista não é apenas uma profissão. É uma responsabilidade moral. E quem a assume, com formação, com experiência, com carteira e, sobretudo, com carácter, sabe que informar é servir.
Por: Yara Simão









