Há datas que não se comemoram apenas com discursos, desfiles, convidados de honra ou medalhas. Comemoram-se com gestos concretos que tocam a vida das pessoas, do povo e da nação. Com gestos que impactam no coração e, sobretudo, no bolso do cidadão.
Os 50 anos de independência de Angola são um desses marcos, não apenas um número redondo no calendário nacional, mas uma oportunidade rara e única para a renovação do compromisso com o povo angolano. É inegável que, nestas cinco décadas, Angola deu passos gigantescos.
Do alcance da independência à liberdade do seu povo; da conquista da paz à reconstrução nacional; da reconciliação nacional à coabitação pacífica entre irmãos anteriormente desavindos; da expansão da educação ao fortalecimento das instituições, há muito que foi feito, e muito que merece ser celebrado.
As recentes condecorações atribuídas a distintas personalidades e entidades pelo Presidente da República são prova de uma nação que reconhece o valor do esforço pessoal e colectivo. Condecorações que nos fazem recordar o contributo majestoso de cada um na colocação de um bloco para a construção dessa enorme nação. Mas, ao lado da festa, também se impõe a reflexão.
Porquanto celebrar meio século de independência é, acima de tudo, pensar nas pessoas. E pensar nas pessoas, hoje, é reconhecer o fardo que muitas famílias e empresas ainda carregam.
O fardo do pós-Covid, o fardo da crise económica e financeira, o fardo da alta dos preços, o fardo da desvalorização do nosso kwanza, que se encontra moribundo, o fardo do desemprego galopante, o fardo dos impostos num contexto de dificuldades económicas, da inflação que consome salários, da informalidade que cresce à margem da protecção do Estado.
Ao lado da festa, também se impõe a reflexão sobre as necessidades prementes do nosso amado povo. As famílias estão sufocadas pela insegurança alimentar; pela pobreza; pela insuficiência dos serviços básicos de saúde, água, energia e saneamento; pelas dificuldades na educação; pelos custos dos livros, cadernos e material didáctico; pelo desemprego que aniquila os sonhos e aspirações de qualquer família.
Os empresários nacionais estão em coma profundo e suplicam por um balão de oxigénio: sem acesso aos financiamentos; burocracias gigantescas para tratar simples documentos formais; custos operacionais elevados e desencorajadores (muitas vezes ainda dependentes do abastecimento de cisternas de água e de geradores de energia); mercado concorrencial complexo e desafiante.
É neste espírito que lanço a sugestão, talvez ousada, mas necessária: e se os 50 anos de independência fossem celebrados com um perdão fiscal generalizado? Sim, um gesto de grandeza e impacto directo social e económico: •Perdão fiscal generalizado para todas as dívidas acumuladas de 2022 até 2025.
•Perdão das dívidas fiscais acumuladas por pequenos e médios empresários, sufocados por crises sucessivas (crise económica, financeira, Covid, etc.), de 2022 até 2025.
•Isenção temporária do IVA sobre produtos e serviços essenciais, que aliviaria o bolso de quem pouco ganha (de 01 de Novembro de 2025 a 31 de Dezembro de 2025);
•Suspensão do IRT para trabalhadores de baixos rendimentos, que devolveria dignidade a quem vive do mínimo.
•Redução do IRT para todos os rendimentos na ordem dos 50%. Seria, sem dúvida, uma medida corajosa que representaria: alívio para as famílias, oxigénio para as empresas, confiança para os investidores e, sobretudo, um sentido palpável de justiça social nas comemorações dos 50 anos de Angola.
Um Estado que olha para o seu povo e diz: “Neste momento especial, vamos partilhar os frutos da independência de forma directa.” Seria uma forma de condecorar o povo angolano de forma palpável e concreta, aliviando a sua dificuldade e dando um sinal concreto de esperança para o nosso povo.
Tal como os diversos indultos realizados em comemoração aos 50 anos de Angola, se perdoamos quem está em conflito com a lei, penso que, podemos perdoar quem faz Angola acontecer.
É claro que haverá cálculos técnicos a fazer. Mas o que proponho ão é uma política fiscal permanente, é uma medida extraordinária para um momento extraordinário, único e comemorativo.
Tal como a paz foi um presente inestimável para o país, este perdão poderia ser o presente do Estado para o seu povo. Afinal, uma celebração que não se traduz em melhoria concreta da vida do cidadão comum corre o risco de ser celebrada apenas por alguns e não tocar na vida e nos corações de todos os milhões de angolanos e angolanas que carregam fardos insuportáveis.
Os 50 anos da nossa Angola pedem algo à altura da sua história. Que esta comemoração passe além das bandeiras, das medalhas, dos desfiles, das galas, dos convidados de honra e dos discursos.
Que se traduza num gesto que fique na memória colectiva como um dos maiores símbolos de proximidade entre o Estado e os seus filhos. Porque, às vezes, o melhor presente de uma nação é o perdão.
Por: OSVALDO FUAKATINUA









