Há silêncios que não absolvem, este, antes condenam, sem audiência ou contraditório, no tribunal íntimo da razão. São silêncios que se instauram como juízes intransigentes, quando a mente, fatigada de discernir, capitula diante da conveniência.
Nestes tempos de fast-thought, a reflexão é dada por suspensa, e o mundo, esse réu confesso de sua própria negligência, recorre à repetição como se ela, por si, constituísse prova irrefutável de verdade.
A liberdade, essa cláusula pétrea do espírito humano, tantas vezes reclamada em discursos inflamados e bandeiras em riste, vê-se cerceada por grilhões invisíveis. Não se trata de cadeias forjadas em ferro, mas de argolas douradas, cravadas de palavras melífluas e dogmas embalados em embalagem de consenso. São cárceres com aparência de abrigo, prisões cognitivas com aroma de paz e que, paradoxalmente, perpetuam o exílio da razão.
E a razão? Ah, essa dama altiva e por vezes austera, feita de silêncios densos e interrogações afiadas como lâminas processuais, encontra-se relegada ao rodapé do discurso público.
E como diz a celebre frase emlatim “Cogitatio, olim virtus, nunc crimen contra ordinem vulgarem” (pensar converteu-se em delito simbólico), um acto quase ilícito, contravenção contra a ordem confortável do senso comum.
Por que interrogar o sistema, se há sempre uma sentença sumária sendo proferida aos berros? Por que seguir o rito da dúvida, se o mundo já homologou suas certezas sem sequer abrir fase instrutória? Ainda assim, há os que resistem apátridas do pensamento automático, insubmissos do espírito.
Entre a balbúrdia e o vazio, ousam invocar o direito natural da inquietação. Sabem que o maior habeas corpus não se escreve em papel timbrado, mas nas entrelinhas da consciência que se recusa a ser tutelada.
Que a verdadeira emancipação não se obtém por decreto, mas pela escolha obstinada de pensar, de desconfiar da resposta pronta, de abrir contraditório mesmo quando o mundo já arquivou o processo.
Porque só há liberdade onde há lucidez. E só há lucidez onde a razão não foi desertada. A consciência, para ser plena, precisa estar emancipada da tirania da facilidade. Pois, digam-me então, há maior escravidão do que aquela em que o algemado não sente as algemas e ainda assim agradece por elas?
Por: LADY ROSA
Docente Universitária e Advogada