Entre aqueles que escrevem e aqueles que lêem subsiste uma necessidade, manifesta na reinvenção de formas específicas de aprisionarem (se) e libertarem (se)
Geralmente, aqueles que se exercitam no domínio da escrita têm ao menos ciência de que tal proeza não subsista só, alguns diriam que procede de um exercício comprometido com a leitura, outros pela necessidade de partilha com destaque para as modalidades da linguagem, todavia, das cogitações possíveis, pode-se dizer que o leitor e o escritor estão conectados e comprometidos, embora nesta quase inseparável união esteja também a manifestação unívoca, particular, em virtude do que cada tem vindo a fazer e, num outro prisma, justificar sua importância. Há uma linguagem que permeia o eu do escritor e move o leitor para um encontro oportuno, visando a descoberta do primeiro pelo segundo.
Esse facto não é impeditivo para aqueles que têm a leitura como fonte de afirmação num contexto histórico-social, enfim, na própria vida. Ademais, com base nas contribuições empíricas e fundamentadas na Psicologia do Desenvolvimento ou das Idades e Psicolinguística, percebe-se que o ciclo evolutivo, principalmente no que ao acto de ler e escrever diz respeito, primeiro as pessoas aprendem a balbuciar, a seguir vão adquirindo formas mais completas na pronúncia das palavras de base: pai e mãe, somente mais tarde das palavras mais complexas.
Já a escrita, condiciona, entre muitos, pela percepção e coordenação motora, surge como acto consequente. É claro que, se visto sob outro prisma, esse processo não é linear para todos, porém, em todos eles, estão presentes os factores internos e externos responsáveis pela apropriação e desenvolvimento da linguagem falada e escrita.
Ao compreender a leitura como encontro oportuno e acto embasado na relação da vontade entre aquele que escreve e aquele que lê mediados pelo conteúdo, o leitor, neste particular, trata-se de um sujeito que se move pelas causas inerentes ao acto de buscar. Todavia de nada vale a leitura de muitos livros, se não se consegue construir e adoptar um posicionamento, uma ideia a favor ou contra ao que se leu.
O escritor-autor ao tornar pública sua visão de mundo, delimitando- a numa temática, torna-se aberto, revela, mas também torna- se num enigma, pois é preciso não descurar de que as ideias contidas numa obra podem reluzir ou obscurecer uma perspectiva dela ou da própria vida. Daí que se faz míster dizer que escrever e ler é como que um aprisionar-se e libertar-se em dosagem mínima, média e elevada.
Quem escreve, sob a veia daquilo que norteia seu exercício, partilha visões múltiplas, convicções, grandezas, também fragilidades (…), todas na linhagem da possibilidade perceptiva das lentes e habilidades do leitor, dentro das ciências da alma, do espírito, da natureza e demais fenómenos observáveis e não observáveis simplesmente, pois que, em ciência, o que vale num tempo pode não valer no outro, e sobre isto já dissera Demo (2012) nela os fenómenos são moldáveis e falseáveis.
Na senda do exposto, há quem escreve um livro com finalidade de fazer algo, porém acaba chamando atenção para outra realidade, às vezes, numa que em nada tinha a ver com o estado e pretensões que tomaram conta do exercício investigativo, escrito e não só.
Os elementos que entrelaçam o escritor-autor ao leitor são compreendidos e identificados pela existência e valor proeminente no exercício de ambos, pelo simples facto do escritor afirmar-se, evidenciar-se por via dos outros, os leitores e juntos diferenciam-se. Dir-se-ia que essa distinção ocorre pela observância quer ao nível da prática quer da ideia, porque ao ser materializada pura e simplesmente, ou seja, com a elevação do primeiro, escritor- autor, estaria fadado a um tal fracasso e ao puro esquecimento, por não ser lido.
Facto que, apesar de nefasto, acompanha alguns que se exercitam neste domínio e que por algum motivo não foram lidos, outros, por não serem compreendidos num dado contexto.
Percebe-se que o escritor-autor e o leitor são seres cuja relação é, realmente, justificável e aprazível quando serve para elucidar os níveis de obscuridade que se encontram em cada linha da produção escrita e como forma validativa da afirmação em vários contextos do sujeito leitor.
Chega a ser detestável quando por via da escrita constroem-se juízos que, sob o olhar da separação obra e realidade, destrata-se o ser, sendo visto como péssimo, o que também depende da visão do leitor, sobre o que pode colher na obra.
A relação física entre o escritor e o leitor dá luz e torna concreto o abstracto, em certa medida, pois que é próprio do homem a contradição, embora reconheça-se que esta não deva incidir ou transpassar a essência da sua existência, pois que à luz de Rhoden (2013), o primeiro precede e é superior ao segundo.
Por: FERNANDO ADELINO