Há algum tempo que se assiste da parte de muitos macroeconomistas uma particular atenção a administração cambial nos processos de desenvolvimento económico, passando mesmo tal preocupação a ser conhecida como uma “abordagem de desenvolvimento” para taxas de câmbio.
Uma vez que o nível da taxa de câmbio real tem/terá sempre um forte impacto no processo de acumulação de capital na medida em que afecta(rá) as trajetórias de consumo, investimento e poupança agregada da economia dos países, ou ainda dificultará movimentos de inovação tecnológica, por via da definição do nível do salario real (como no caso da “Doença Holandesa” ou “maldição dos recursos naturais”).
De forma geral, se analisarmos as economias africanas, facilmente veremos que uma das principais causas das crises observadas/vividas na maioria delas nos últimos 20 anos segue um padrão de individamento externo e sobrevalorização da taxa de câmbio (ciclos de apreciação cambial, crescentes déficits em conta corrente e colapsos externos).
Em muitas geografias (especialmente as menos desenvolvidas), é bastante comum assistir-se a recorrentes déficits orçamentais, como consequência de aumentos salariais acima dos reais níveis de produtividade do factor de produção trabalho, ou ainda a promoção de apreciações cambiais insustentáveis, o que somente é possível devido ao “populismo económico”.
Ou seja, melhora-se o bem-estar dos trabalhadores no curto prazo, visando-se os ciclos políticos mas sem levar em dévida consideração as consequências de longo prazo de tais políticas (produz-se distorções com efeitos benéficos no curto prazo a custa de grandes desajustes no longo prazo).
Pois, o desalinhamento da taxa de cambio sem sentido de sobrevalorização é uma ferramenta poderosa de aumento variações no nível dos preços sem contrapartida de adequadas mudanças macroeconómica estruturais, uma vez que não há uma contrapartida de capacidade produtiva para o excesso de procura que se gera. Por si só, tal situação justifica a importância dada a questão dos regimes cambiais, parcticularmente ao método de âncora nominal e das metas reais.
O método de âncora nominal assenta na premissa de que a taxa de câmbio nominal de um determinado país ancora-se à sua taxa de inflação, ou seja, atrela-se o valor da moeda nacional à moeda de um outro país com um registos de inflação mais baixo, bem estabelecidos e dignos de confiança, no caso das economias africanas essa moeda é obviamente o dólar norte americano (caso queira aprofundar melhor esse conceito, aconselhamos a leitura de Michael Bruno, “High Inflation and the Nominal Anchors of an Open Economy”, Essays in International Finance 183, International Finance Section, Princeton University, 1991).
Importa salientar que para esse método funcionar, o atrelamento a uma taxa fixa do dólar implica na verdade uma inflação baixa importada dos EUA. Mais isso suscita uma questão que teima não calar, isso, efectivamente funciona? Se deixar-mos de lado, as especulações sobre a moeda, esse método somente é eficaz se e somente se haver de facto disciplina nacional e acréscimos no mercado de trabalho (uma vez que o sector de bens comercializáveis não tradicional seria estimulado por uma negociação competitiva cujo destaque recairia para o dinamismo e potencial da inovação tecnológica, com impactos no aumento da produtividade necessária ao processo de desenvolvimento económico).
Se estivermos num regime de taxas de câmbio fixo, mas cotinuarmos a assistir a uma expansão da base monetária, teremos um declínio das reservas cambiais, pois as mesmas não suportam(rão) sine die (tal como verificado em Angola nas duas últimas décadas).
De acordo com o método da âncora nominal os déficits fiscais não podem ser financiados pela criação de moeda e não será na medida em que um aumento na procura por moeda permita alguma expansão da base monetária sem um declínio nas reservas cambiais.
Assim sendo, o regime de âncora nominal entrará em colapso se não for mantida uma disciplina fiscal (o que tem sido um dos principais problemas de economias em desenvolvimento). Além disso, se a taxa de inflação dos preços dos bens negociáveis for reduzida para o nível dos impostos do país que serve de âncora, também deverá ser feito um ajustamento na variação nominal da taxa de câmbio em igual proporção.
Se assistir-se crescimentos numa velocidade mais alta, o progressos real pelo menos nos sectores de bens negociáveis aumentará (os setores importador-concorrente e exportador), e se esse crescimento for maior e/ ou mais rápido que o aumento da produtividade, ocorrerão aumentos no nível de desemprego e perdas de resultado.
Se não é expectável que a taxa de inflação diminuia, porque não se espera que o regime de câmbios fixos possa ser suspenso, então a variação da inflação também não declinará, ou pelo menos não o suficiente.
Como é provável que os preços dos itens não negociáveis aumente juntamente com a evolução, a política de âncora nominal precisa verificar-se cosideráveis acréscimos no mercado de trabalho.
Essa substituição depende não somente do atrelamento da taxa de câmbio, mas também da substituição da política monetária. É realmente possível alcançar uma disciplina de política monetária, que em geral depende em grande medida de uma disciplina fiscal?
Por: WILSON NEVES
*Economista