Luanda, aos 17.07.2025
Na senda do mais recente corte dos subsídios aos combustíveis (gasóleo), levado acabo pelo governo angolano, que tem dado origem a reações distintas (e, em alguns casos mesmo, extremas) por parte dos diferentes extractos da sociedade angolana, deparei-me com um “meme” criado pelos estudantes da Faculdade de Economia e Gestão da Universidade Católica de Angola (na qual lecciono), sobre uma das muitas reflexões macroeconómicas e socias discutidas por nós em aulas, demonstrando-nos que a “semente” efectivamente tem caído em boa terra.
“O preço do táxi subiu para Kz 300, o Wilson Neves: As pessoas adaptam-se”!.. Os diferentes eventos geopolíticos internacionais, bem como as variações registadas na produção petrolífera (nacional e internacional) e a dinâmica dos ciclos económicos, têm marcado nas últimas décadas a evolução dos preços do petróleo nos mercados internacionais, o que, dado a “sublime” importância desta commoditie na economia angolana, a redução substancial das receitas provenientes deste sector acaba por afectar drasticamente as finanças públicas e consequentemente a capacidade do governo em fazer frente às várias despesas/necessidades públicas.
Em consequência, o governo é obrigado a cortar nas despesas (não obstante, em nosso entender, nem sempre cortar aí onde efectivamente mais sentido faz e/ou pode-se gerar resultados mais significativos).
O principal argumento apresentado essencialmente pelas entidades económicas e financeiras internacionais para o corte dos subsídios aos combustíveis, é que os mesmos tendem a beneficiar de forma desproporcional as famílias mais ricas, sobrecarregando simultaneamente as finanças públicas e reduzindo o espaço fiscal para a realização de investimentos em capital humano e infra-estrutura, além de distorcerem os incentivos económicos (por via do favorecimento de sectores com alto consumo de combustível e promoção de uma alocação excessiva de recursos para tais indústrias).
De acordo com o artigo do Banco Mundial sobre a mitigação dos efeitos adversos da reforma dos subsídios aos combustíveis em Angola (Bao-We-Wal Bambe, Chadi Bou Habib e Joaquín Marandino Peregalli, 22 de Maio de 2025), a eliminação dos subsídios aos combustíveis seria capaz de gerar poupanças fiscais suficientes para compensar os aumentos nos custos de produção.
Uma vez que, por exemplo, no sector das pescas os combustíveis representam 57% dos insumos produtivos (não obstante receber uma parcela relativamente pequena dos subsídios), ao passo que no sector dos transportes rodoviários os mesmos representam 42% dos custos operacionais (absorvendo 17% dos subsídios totais aos combustíveis).
De acordo com simulações baseadas na tabela de insumo-produto de Angola (2015), que indica que os aumentos nos preços dos combustíveis ocorrido em Junho de 2023 e Abril de 2024 elevaram o nível geral de preços em 1,6% (com os custos nos sectores da pesca e dos transportes a aumentarem na ordem dos 5,9%, cada um), compensar integralmente esses dois sectores exigiria somente 29,6% da poupança fiscal gerada.
Num cenário de corte total dos subsídios, o nível geral de preços aumentaria 5,2% (19,5% nos custos do sector da pesca e 20% nos custos no sector dos transportes, mas a compensação dos mesmos sectores consumiria somente 30,2% da poupança fiscal gerada). Acreditamos que tanto os argumentos das instituições financeiras internacionais e da literatura económica quanto as projecções feitas pelos economistas do Banco Mundial sejam verdadeiras/assertivas.
No entanto, entendemos que, frequentemente, de forma propositada ou não, tem se esquecido/descurado uma variável fundamental a quando da construção/cópia de soluções para a economia angolana: “a economia é essencialmente uma ciência social, ou seja, as soluções económicas devem levar em consideração que os sonhos, as necessidades, as vontades, as prioridades e as aspirações das pessoas variam de sociedade para sociedade”.
Logo, uma vez que o combustível é um insumo fundamental para a actividade económica e social em Angola, a eliminação de subsídios aos mesmos altera substancialmente a estrutura de custos sectoriais (impactando no emprego, na competitividade e, sobretudo, no bem-estar das famílias).
Assim sendo, o grande dilema das autoridades angolanas reside exactamente em encontrar/construir um equilíbrio entre a redução das distorções inerentes à reforma dos subsídios aos combustíveis (consequentemente, aumento do preço final dos combustíveis) e, simultaneamente, a adopção de um conjunto de medidas económicas e financeiras susceptíveis de amortizar os impactos adversos sobre a economia (em geral) e as famílias de baixa renda (em particular).
As reformas levadas acabo no sector dos combustíveis (corte de subsídios) devem ser cuidadosamente planeadas, uma vez serem susceptíveis de agravar a insegurança alimentar (por via dos sectores da agricultura e das pescas, por exemplo), bem como aumentar a pobreza e a desigualidade (potenciais geradores de tensões sociais). Assim sendo, para a mitigação de tais riscos, é importante que a eliminação dos subsídios aos combustíveis não se deva centrar na sua gradualidade ou não, mas sim se a mesma é ou não acompanhada de medidas compensatórias concretas.
Ou seja, entendemos que o verdadeiro cerne da questão não se centra no corte ou não dos subísidios aos combustíveis, mas sim na construção/implementação de uma política de transportes públicos efectiva e eficiente (o que falta em Angola há bastante tempo, infelizmente).
Entendemos sim que a construção de uma solução duradoira dessa magnitude exige por parte do governo um esforço financeiro considerável, pelo que a sua implementação exige/exigirá sacrifícios, no entanto é imperioso que os mesmo sejam “universais” (atinja governados e governantes), sejam mensuaráveis e definidos num horizonte temporal exequível.
Por: WILSON NEVES
Economista









