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Obreiros da verdade: “a nobre missão do jornalista angolano em tempos de conflito e reconstrução”

Jornal OPaís por Jornal OPaís
30 de Maio, 2025
Em Opinião
Tempo de Leitura: 5 mins de leitura
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Obreiros da verdade: “a nobre missão do jornalista angolano em tempos de conflito e reconstrução”

Ao longo das últimas décadas, marcadas por períodos de angústia, separações familiares, deslocações forçadas e dor colectiva, uma classe profissional temse mantido firme, discreta e resiliente: os jornalistas.

Homens e mulheres de palavra e imagem, que, em vez de armas, empunharam gravadores, câmaras, microfones e blocos de notas. Foram eles que, quando muitos se refugiavam no silêncio ou no medo, ousaram contar a verdade de um povo em sofrimento.

Esta missão, tantas vezes incompreendida, revela-se hoje como um dos mais nobres serviços prestados à memória colectiva, à dignidade humana e à coesão social. Não é tarefa menor documentar a dor.

Entre escombros e poeira, lágrimas e gritos, a figura do jornalista ergue-se, não como protagonista, mas como testemunha. Testemunha de mães que perderam filhos, de crianças que cresceram sem conhecer os pais, de pessoas com deficiência e mobilidade reduzida, de aldeias esvaziadas pela guerra, de escolas transformadas em ruínas, de idosos privados do aconchego familiar.

O jornalista não apenas registra. Ele transforma o invisível em visível, o esquecido em lembrado, o ausente em presença narrativa. E é essa acção — por vezes solitária, muitas vezes perigosa — que permite a um povo recordar, reconstruir e seguir em frente.

Durante os anos mais sombrios da história recente, os jornalistas angolanos cumpriram sua missão em condições extremamente adversas e sem seguro de vida. Munidos apenas da coragem e do dever de informar, atravessaram estradas perigosas, visitaram zonas de risco, enfrentaram escassez de recursos, e, muitas vezes, viram-se diante de dilemas éticos e humanos profundos. Havia o dever de relatar, mas também a dor de sentir.

Havia o compromisso de informar, mas também o peso do luto — próprio e alheio. Quantos destes profissionais regressaram das missões profundamente marcados? Quantos choraram silenciosamente após entrevistar uma criança sozinha, um ancião abandonado, uma jovem mulher devastada pela violência? Quantos sepultaram colegas tombados em missão e, ainda assim, voltaram no dia seguinte ao seu posto, por respeito à verdade e ao povo que servem? O luto do jornalista é um luto duplo: o luto pelo que viu e pelo que perdeu.

Mas, frequentemente, este luto não encontra espaço no debate público, nem consolo no tempo. Há um traço profundamente humano na prática jornalística que raramente é reconhecido: a empatia silenciosa.

O jornalista que ouve o pranto de uma mãe, que regista o testemunho de um sobrevivente, que acompanha uma busca desesperada por um ente querido desaparecido, carrega consigo um pedaço da dor alheia. Ele não apenas escreve ou transmite: ele sente.

E por isso mesmo, não se pode compreender a verdadeira dimensão do trabalho jornalístico sem considerar a sua carga emocional. Ao longo das décadas, muitos foram os jornalistas angolanos que desempenharam um papel vital na localização e reunião de famílias separadas. Em regiões onde as comunicações eram escassas ou inexistentes, a rádio, sobretudo a comunitária, tornou-se instrumento de reencontro.

Com frequência, através de uma simples mensagem transmitida ao vivo, parentes distantes descobriam que alguém ainda os procurava, ainda os esperava, ainda os amava.

Em inúmeras ocasiões, o jornalista foi, assim, o intermediário do milagre: aquele que restituiu ao ser humano a sua história, o seu nome, a sua pertença. Quais foram os rostos visíveis do programa “Nação Coragem”? Na etapa da reconstrução social, cultural e espiritual, os jornalistas continuaram a exercer um papel insubstituível.

Denunciaram situações de exclusão social, visibilizaram grupos vulneráveis, acompanharam acções de reintegração dos ex-combatentes, de crianças, idosos e famílias deslocadas, alertaram para a necessidade de protecção dos mais frágeis e estimularam a solidariedade. Ao fazê-lo, contribuíram silenciosamente para a tecedura do tecido social, desgastado pela dor e pela separação.

Em meio a tantos desafios, destaca-se a coragem destes profissionais, não apenas para enfrentar a adversidade externa, mas também para lidar com a sua própria vulnerabilidade interior. Muitos sofreram perdas irreparáveis: colegas, amigos, cônjuges, filhos.

Outros, marcados por memórias dolorosas, enfrentam ainda hoje as consequências emocionais de uma profissão que exige tanto e, por vezes, pouco devolve. E no entanto, persistem. Continuam a contar histórias. Continuam a ouvir, a registrar, a dar voz.

Importa também destacar o papel educativo do jornalista. Ao retratar a realidade com ética e sensibilidade, contribui para formar uma opinião pública mais informada, mais consciente, mais empática. Não se trata apenas de noticiar, mas de formar consciências.

O jornalista que cobre a vida quotidiana dos lares de acolhimento, que acompanha crianças órfãs em centros de reabilitação, que documenta o cuidado de idosos solitários, está a edificar pontes invisíveis entre os corações. Está a cultivar a humanidade.

Há, por conseguinte, um dever colectivo de valorização desta classe. Tal valorização não se limita a homenagens simbólicas. Ela começa pelo reconhecimento da importância da memória e da preservação do acervo jornalístico, passa pela promoção da saúde mental dos profissionais, estende-se ao apoio às famílias dos que tombaram ou adoeceram em missão, e culmina na criação de espaços de escuta e de celebração da vida e do legado destes trabalhadores da palavra.

A história de um país não se escreve apenas com datas, tratados ou obras materiais. Ela se escreve, sobretudo, com as vozes que a narram, com as imagens que a perpetuam, com os gestos de humanidade que a sustentam.

Os jornalistas angolanos, ao longo de cinco décadas, têm sido tecelões dessa história viva. Em cada texto, em cada reportagem, em cada fotografia, repousa uma fração da alma colectiva de um povo que muito sofreu, mas também muito resistiu. Hoje, quando se fala em reconstrução, importa lembrar que reconstruir não é apenas levantar paredes ou restaurar estradas.

É, sobretudo, reconstruir o vínculo humano. É restaurar a confiança, é reanimar a esperança, é reerguer os que foram invisibilizados. E nesta missão, os jornalistas continuam a ser aliados insubstituíveis.

Talvez seja chegada a hora de instituir um espaço de memória e gratidão. Um memorial onde os nomes daqueles que deram a vida em nome da verdade possam ser recordados com dignidade.

Um espaço onde se possa revisitar a história contada pelos que a testemunharam com risco, coragem e abnegação. Um lugar de luto e de luz. De pranto e de esperança.

Que nunca nos esqueçamos de que, por detrás de cada fotografia marcante, de cada reportagem sensível, de cada crónica pungente, existe um ser humano. Um homem ou uma mulher que sentiu, que arriscou, que escolheu a verdade mesmo diante da dor. São eles, os obreiros da verdade, que nos permitem lembrar o que fomos, entender o que somos e sonhar o que podemos vir a ser.

Por: JOÃO BAPTISTA KUSSUMUA

João Baptista Kussumua /25.05.2025

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