O artigo “O Pulso da Situação (Sócio)Linguística de Angola” apresenta uma análise abrangente da realidade linguística angolana, destacando o seu caráter plurilíngue e a complexa coexistência entre as línguas autóctones (bantu) e o português, herança do período colonial.
O autor parte de uma reflexão sobre a língua como instrumento de comunicação e poder simbólico, evidenciando que, em Angola, o uso e o prestígio linguístico estão profundamente marcados por fatores históricos, sociais e geográficos.
Angola é descrita como um país com um mosaico étnico-linguístico rico e diverso, onde a maioria dos cidadãos fala pelo menos duas línguas: a língua materna (L1), de origem africana, e o português (L2), língua oficial e veicular.
No entanto, a urbanização e as políticas linguísticas do período colonial e pós-colonial geraram dois fenómenos contrastantes: o monolinguismo urbano, em que se fala apenas o português, e o monolinguismo rural, em que predominam as línguas autóctones.
Esses grupos revelam tensões entre prestígio e marginalização: enquanto o português é visto como símbolo de status e modernidade, as línguas africanas são frequentemente associadas a atraso, analfabetismo e ruralidade.
Com base em autores como Bourdieu (1998) e Fiorin (2007), o texto reforça que a imposição da língua dominante nas cidades constitui uma forma de poder simbólico, responsável por desvalorizar e silenciar as demais línguas nacionais. Esse processo resultou em preconceito linguístico, ainda presente nas relações sociais e institucionais, sobretudo na escola e nos meios de comunicação.
O autor denuncia o “linguocídio” simbólico sofrido pelas línguas endógenas e o preconceito contra seus falantes — expressões como “sulano”, “kasongo” ou “os da província” exemplificam essa discriminação histórica.
A análise geolinguística, com base em Costa, Botelho, Solla e Soares (2016), mostra a distribuição das principais línguas nacionais: Kimbundu, Kikongo, Umbundu, Cokwe, Ngangela, Nyaneka, Kwanyama, entre outras, cada uma associada a grupos étnicos e regiões específicas. O texto sublinha que o português, apesar de ser a língua oficial e de comunicação nacional (Art. 190 da Constituição), não deve sobreporse às línguas nacionais, mas coexistir em regime de complementaridade.
A política linguística vigente, porém, ainda privilegia a norma urbana e o português-padrão, o que reforça a desigualdade e ameaça a vitalidade das línguas autóctones.
O artigo também observa o impacto fonético e morfossintático das línguas maternas sobre o português falado em Angola, o que se manifesta em sotaques regionais e variações reconhecíveis — como o “akimbundamento” ou a “acokwezação” do português.
Essas marcas, longe de representar erros, expressam a identidade linguística nacional e demonstram que o português angolano é produto de um processo histórico e cultural único. Nas conclusões, o autor defende a valorização das línguas nacionais e o combate ao preconceito linguístico. Argumenta que a diversidade linguística é natural e deve ser vista como riqueza e não como obstáculo à unidade nacional.
Propõe uma reflexão profunda sobre o ensino da língua portuguesa em contexto bilingue ou plurilingue, sugerindo políticas educacionais que reconheçam as variedades locais e incluam os diferentes modos de falar (“geoletos, socioletos, etnoletos e dialectos”) como expressões legítimas da angolanidade. Assim, a principal mensagem do texto é que respeitar as línguas autóctones significa afirmar a identidade cultural de Angola.
O autor conclui que cada comunidade deve ser livre para falar segundo a sua norma linguística, sem medo de discriminação, porque aceitar as diferenças sociolinguísticas é reconhecer o poder da diversidade.
Por: Jorge Muzengo









