Nos últimos tempos, os telejornais internacionais despendem longas horas na promoção e divulgação de guerras ou ameaças de guerra, como se de algo grandioso se tratasse.
Atiçam, de todas as formas, as partes envolvidas (Rússia-Ucrânia, Israel-Palestina, Israel-Irão, Congo-Ruanda, Tailândia-Camboja, entre outras), visando, estranhamente, activar a fúria de uns contra os outros.
Contam-se os ataques e as baixas humanas como se fossem números de um matadouro, ou um espetáculo cinematográfico. Relatam-se os drones e mísseis que conseguiram ultrapassar os cordões de segurança e exibemse as vítimas como se estivéssemos a assistir a uma telenovela mexicana ou brasileira.
É estranho que tão raramente se fale dos caminhos para a paz, das possíveis mediações internacionais ou, sequer, das formas de alcançar um entendimento entre os contendores.
Mais estranho ainda é ver organizações e figuras internacionais, que deveriam ser os principais mediadores e guardiões da paz, remetidas a um silêncio sepulcral, sem acções concretas, enclausuradas, sem fazerem ouvir as suas vozes em defesa da tão necessária paz e, sobretudo, da vida humana.
É também estranho que as Nações Unidas, cuja missão última é alcançar a paz mundial, não tenham recursos nem capacidade para envolver as partes em conflito, nem que seja apenas para as colocar frente a frente à mesa de negociações. Parece que o mundo ficou refém da insaciável vontade de guerra de alguns contendores e dos seus beneficiários ou, realmente, emburreceu.
O silêncio sobre a paz é ensurdecedor, a tal ponto que quase ninguém se atreve sequer a falar dela. Discorre-se sobre a capacidade militar e sobre a necessidade de aumentar os orçamentos de defesa, mas raramente se fala da urgência de se sentarem à mesa para dialogar.
Pelo contrário, qualquer comentador ou analista que tente propor tal ideia é imediatamente atacado e ridicularizado, como se fosse um demente. A imprensa internacional parece sedenta de sangue, tudo fazendo para que novos episódios sangrentos apareçam nas nossas telas.
O desejo de audiência e de ser o primeiro a noticiar tem-se sobreposto a qualquer tentativa de promover a paz. O mundo parece ter emburrecido e tornado a vida humana, em certos povos, sem valor. A guerra, ou mesmo o desejo de a anunciar, tornou-se um espetáculo mediático.
O mundo que buscava viver em paz e harmonia desapareceu das nossas telas. O mundo que defendia a eliminação de armas de destruição em massa e nuclear desapareceu.
O mundo que acreditava no diálogo multilateral, através de organizações internacionais e regionais, também desapareceu. Hoje, ouvir alguns telejornais é tarefa que deveria ser acompanhada por um comprimido de captopril para controlar a pressão arterial.
Assistimos em directo a ataques de todas as formas: mísseis sofisticados que combinam precisão, alcance e tecnologia avançada, mísseis balísticos que espalham terror, drones assassinos e até ataques económicos (guerra das taxas), que causam igualmente inúmeras vítimas. Surge um novo mundo, onde o individualismo, o fecho de fronteiras, o unilateralismo e, pior ainda, a xenofobia e o racismo ocupam, pouco a pouco, lugares de destaque. Infelizmente, o mundo mudou e para pior.
O risco de proliferação de conflitos agravou-se. As fronteiras estatais e regionais fecham-se, crescem os nacionalismos exacerbados, partidos radicais e de extrema, movidos por ideais nacionalistas, ganham força, e conceitos que julgávamos já ultrapassados ressurgem.
A fome em África, o aquecimento global, o debate sério sobre a imigração, a luta contra o VIH/Sida, o Ébola e tantas outras doenças crónicas e infeciosas, o combate ao analfabetismo e a procura de soluções globais de fundo foram engavetados ou esquecidos.
Já não são temas centrais nos telejornais ou nos debates públicos, tendo dado lugar à guerra e ao seu fomento, que agora ocupam grande parte das grelhas editoriais. Os generais e tenentes tornaram-se os comentadores e analistas privilegiados dos nossos ecrãs.
Sendo especialistas em guerra, explicam e projetam todos os cenários possíveis, descrevendo munições, detonadores, mísseis e sistemas de defesa sofisticados. Hoje, falar de guerra tornou-se a principal bandeira dos noticiários internacionais.
O mundo parece ter-se tornado belicista e selvagem, dominado pelo desejo de destruir o próximo. Quem realmente ganha com tudo isto são as indústrias de armamento, aquelas que fabricam as armas que visam matar.
Estas, disfarçadas sob o manto do medo e da “necessidade de defesa”, patrocinam a ideia de que é urgente rearmar o mundo, gastando montanhas de dinheiro todos os anos, como se o diálogo, gratuito e permanente, não fosse o melhor caminho para a segurança global.
Os Estados, desesperados por proteção, rearmam-se, investindo milhões para se sentirem mais seguros, o que, paradoxalmente, cria insegurança nos vizinhos. Sempre que um Estado ou bloco investe em armamento de longo alcance, outro Estado ou bloco sente-se ameaçado, transformando este processo num ciclo vicioso, perpétuo e perigoso. Parece que estamos a testar o poder destrutivo das partes ou estamos a emburrecer completamente.
Urge parar de promover, ainda que inconscientemente, a guerra nos principais telejornais e debates televisivos. Devemos priorizar a promoção do diálogo e da paz. É imperativo dar voz a quem pretende mediar os conflitos, abrir espaço para que exponham as suas visões e opiniões.
Devemos dar lugar às reservas morais do mundo: igrejas, organizações promotoras da paz, Nações Unidas e os seus diversos canais, bem como aos representantes dos povos que sofrem, na pele, as consequências destes conflitos.
Por: OSVALDO FUAKATINUA