Quantas vezes já ouviu a expressão “omo”? Provavelmente mais vezes do que consegues contar. No uso corrente da linguagem informal angolana, omo é uma palavra que serve para designar qualquer detergente em pó, independentemente da sua marca comercial.
A origem do termo residiu na conhecida marca internacional Omo, pertencente à multinacional Unilever, que marcou presença destacada no mercado angolano sobretudo durante as décadas de 1980, 1990 e início dos anos 2000.
Com o passar do tempo, e mesmo após a retirada da marca dos circuitos de distribuição locais, a designação omo manteve-se viva na boca do povo, convertendo-se numa referência genérica para todos os detergentes em pó.
Este fenómeno linguístico é identificado como um caso de generalização metonímica de marca registada, em que o nome comercial de um produto específico passa a representar toda uma categoria de produtos.
É um processo natural nas línguas vivas, que revela, neste caso, não só um traço de memória colectiva, como também uma forma pragmática de nomeação enraizada no quotidiano.
Na prática, seja nos mercados, nos musseques, ou nas conversas caseiras, omo já não nomeia apenas um produto, mas sim um tipo de produto. Perdeu a exclusividade comercial e ganhou autonomia linguística.
Assim, quando alguém diz: “Quero um pacote de omo.” “Não tem omo?” “Quanto custa o omo?” “Vai querer que tipo de omo?” … está, na realidade, a referir-se a qualquer detergente em pó, seja ele Madar, Ultra, Master Clean, ou outro.
Este uso demonstra a criatividade colectiva e a capacidade de apropriação cultural do povo angolano. Mais do que uma simples herança de uma marca, omo tornou-se um símbolo linguístico funcional, adaptado às realidades locais e às práticas comunicativas do dia-a-dia.
A palavra passou a circular com vida própria, como um signo da identidade linguística angolana. Tentar corrigir este uso, substituindo “omo” por “detergente em pó”, pode parecer, à primeira vista, uma acção de correcção linguística.
No entanto, trata-se, muitas vezes, de um gesto que desconsidera o valor simbólico e cultural da fala popular. Quando você diz ao Angolano: “não se diz omo, diz-se detergente”, estás a despir a espontaneidade, o falar próprio da banda.
Logo, ao preservar expressões como “omo”, não se referindo a uma única marca de detergente, estamos também a preservar um pedaço do património imaterial angolano, a forma própria do uso da língua.
É que a linguagem informal, por mais distante que esteja da norma padrão, fala de nós, dos nossos hábitos, da nossa história e das formas como nomeamos o mundo à nossa volta.
O português falado em Angola tem vindo a ganhar raízes próprias, fruto das influências das línguas nacionais e do quotidiano sociocultural. Embora ainda em processo de consolidação, é já possível identificar marcas distintivas que o diferenciam de outras variantes da língua portuguesa, tanto ao nível da fonética como da sintaxe e da lexicologia.
A expressão “omo”, por exemplo, é apenas uma entre muitas palavras em uso que revelam a riqueza linguística e a criatividade popular que caracterizam o português angolano.
O Dicionário da minha banda tem, na verdade, como objectivo reunir e preservar expressões próprias do português falado em Angola, com destaque para aquelas que fazem parte do uso quotidiano.
Trata-se de um esforço para valorizar o património linguístico nacional, dando visibilidade a palavras e expressões que refletem a vivência, a criatividade e a identidade cultural do povo angolano.
Por: LUDIJÚNIOR DIAS









