Vivemos tempos em que ser conhecido vale mais do que ser coerente. Na Angola digitalizada, o conceito de “influência” tem sofrido um esvaziamento que não é apenas semântico: é moral, é cultural e é, sobretudo, intelectual.
A juventude já não quer ser como os professores, os cientistas ou os grandes pensadores que marcaram gerações. Quer ser seguida. Quer ser vista. Quer ser comentada.
Estamos a formar uma geração que deseja mais o engajamento do que o entendimento, mais o palco do que o conteúdo. Para muitos, a autoridade não está mais no saber, mas no número de seguidores que se consegue acumular, nem que para isso seja necessário vender o próprio ridículo em parcelas semanais. Influenciador, hoje, é quem aparece.
Não importa o que diz, mas se diz com voz suficiente para que o algoritmo escute. E assim, os rostos que nos surgem nos ecrãs, todos os dias, tornaram-se as novas bússolas de uma juventude órfã de referências sólidas.
Não se trata de um ataque pessoal — trata-se de uma leitura colectiva: os mais seguidos são, muitas vezes, os menos preparados. Para aferir o real papel destes novos actores sociais, é necessário, antes, compreender o ambiente onde surgem e se tornam celebridade.
A ausência de políticas públicas sólidas para a juventude, a descredibilização das figuras do saber tradicional e a crise de confiança nas instituições do Estado abrem espaço para o surgimento de novas figuras de referência.
Contudo, tais figuras não têm, em regra, sido capazes de materializar a responsabilidade social que a sua visibilidade exige. As redes sociais tornaram-se, pois, um palco onde tudo pode ser dito, mesmo que nada se diga.
É um cenário onde a ligeireza do conteúdo é proporcional ao entusiasmo da audiência. Portanto, é justo perguntar: estamos a seguir quem nos inspira a crescer, ou quem apenas nos entretém com distracções embaladas em filtros e danças? Num país em que parte significativa da população jovem se encontra sem trabalho digno, sem acesso pleno ao ensino superior e com um futuro cada vez mais improvisado, seria expectável que as vozes mais ouvidas — as tais “influentes” — canalizassem a sua energia para causas comuns, para temas urgentes, para mobilizações que construam algum tipo de consciência colectiva.
Mas o que se vê, com lamentável frequência, é o contrário: a superficialidade transformada em conteúdo e o absurdo apresentado como conquista. O problema não é o humor, o entretenimento ou a leveza.
O problema é quando isso se torna o único horizonte. Porque uma juventude alimentada apenas de diversão rápida perde o apetite por ideias densas. A crise de referência não se resume à ausência de figuras sábias.
É, sobretudo, a presença insistente de vozes que não dizem nada, mas que gritam muito. E, como se sabe, onde há muito ruído, há pouco discernimento. É urgente, portanto, resgatar o valor do conteúdo.
Não se trata de elitizar a influência, mas de devolvê-la ao seu sentido mais profundo: influenciar para elevar, para despertar, para fazer pensar. Precisamos de influenciadores que leiam livros, que falem com propriedade, que saibam distinguir entre ser famoso e ser necessário.
A juventude angolana, tantas vezes rotulada de apática, precisa de referências que a desafiem a ser mais — e não apenas a parecer mais. É possível rir e pensar. É possível entreter e educar. É possível, sim, ser influente e responsável ao mesmo tempo.
Mas para isso é preciso haver intenção, compromisso e, sobretudo, consciência. Enquanto isso não se materializa, continuaremos a caminhar num deserto de sentido, onde os oásis são de plástico e as palmeiras, filtros de Instagram. Porque, no fim, a verdadeira influência não se mede por cliques, mas por transformação.
Por: JOÃO NGUMBE