Há sensivelmente quatro anos, fui convidado a falar sobre vendas para uma turma de empreendedores, na Mediateca do Cazenga. A sala estava cheia, composta essencialmente por empreendedores bem experimentados.
Quando chegou a minha vez, depois da intervenção do empresário e especialista em turismo Bernabé, levantei-me e, sem proferir uma palavra, dirigi-me ao quadro e escrevi apenas uma frase: “Esqueçam-se das vendas, foquem-se no relacionamento”.
Em alguns rostos percebia-se desconforto, quase repulsa. Noutros, curiosidade e interrogação. No seio corporativo, onde os resultados são frequentemente medidos em números, a palavra “venda” domina sempre as discussões.
A provocação, neste contexto, tinha um objectivo definido: mostrar aos empreendedores que vender e relacionar-se são coisas diametralmente opostas, e que confundir esses conceitos pode comprometer, substancialmente, a sustentabilidade dos negócios.
A venda é orientada para o produto ou serviço, enquanto o relacionamento é um processo sustentado na confiança, escuta, empatia e compreensão das necessidades do outro. Enquanto a venda procura convencer o cliente, o relacionamento procura conectar-se.
Sendo assim, a venda passa a ser consequência, e não objectivo em si. Estudos da Harvard Business Review demonstram que empresas que valorizam o relacionamento com o cliente apresentam taxas de retenção significativamente superiores às que se focam apenas na venda.
Um exemplo interessante é a empresa norte-americana Zappos, especializada em comércio electrónico. Em vez de pressionar os seus vendedores com metas, a empresa treinou as equipas para ouvir, compreender e criar vínculos com os clientes, mesmo que isso não significasse vender.
O resultado foi assustador, um crescimento sustentado, transformando os compradores ocasionais em verdadeiros promotores da marca. Já defendi, em outros artigos, que os consumidores compram por influência da emoção e justificam a decisão de forma racional. A neurociência ajuda a compreender este comportamento. O neocórtex, responsável pela lógica, pela linguagem e pelo pensamento analítico, não é o centro das decisões emocionais.
Essas decisões são processadas, sobretudo, pelo cérebro límbico, responsável pelas emoções, sentimentos e memórias afectivas. Quando o foco centraliza-se exclusivamente na venda, o consumidor percebe que os seus sentimentos estejam a ser desprezados, o que o obriga a activar os mecanismos de defesa, como a desconfiança, a resistência e, finalmente, a rejeição. Já quando o foco centraliza-se no relacionamento, o cliente sente-se respeitado, ouvido e valorizado.
A comunicação deixa de ser persuasiva e passa a ser empática. É nesse ambiente em que a confiança se constrói, resultando da coerência entre discurso e prática, da verdadeira intenção e da constância do comportamento. Essa lógica não é nova.
Pode ser observada na forma como Cristo chamou os seus discípulos. Ele não apresentou propostas, não prometeu ganhos imediatos e nem sequer utilizou técnicas de argumentação. Antes de convidá-los, aproximava-se, convivia, escutava e compreendia os motivos mais profundos de cada um. Só depois dizia: “Segue-me”, que podemos interpretar como o convite à venda.
O chamado não consistia numa transacção, mas numa relação. Pedro não havia largado a pesca por benefício material; fê-lo porque confiou. Mateus não abandonou a cobrança de impostos por conveniência, mas porque se sentiu compreendido.
Jesus estabelecia vínculo e, só depois, convidava para o compromisso. É precisamente essa premissa que sustenta qualquer relacionamento. Quando a intenção é verdadeira, o cliente percebe, mesmo que de forma inconsciente.
Quando o propósito se perde, o relacionamento enfraquece e a venda transforma-se num esforço desgastante. Os discípulos poderiam ler as intenções de Cristo e ainda assim o seguiriam.
Se os seus clientes lessem suas reais intenções de venda, também comprariam? Se a resposta for não, está na hora de mudar e encontrar a forma correcta de vender que se baseia no relacionamento. Pois, quando o relacionamento é verdadeiro, a venda acontece de forma natural. Quando a venda é o único objectivo, o relacionamento dificilmente sobrevive.
Por: Olívio dos Santos
Consultor de Comunicação Integrada









