Dois casos recentes fazem recuar ao passado. O primeiro foi um relacionado aos agentes da Empresa de Distribuição de Electricidade (ENDE), que acabaram agredidos depois de terem feito a cobrança pelo uso do produto num bairro de Luanda. Por terem incumprido, os consumidores acabaram por ver os técnicos no tecto a efectuar o corte, porém não aconteceu depois destes terem sido completamente sovados.
O outro caso está associado a um pronunciamento do ministro da Agricultura e Florestas, Isaac dos Anjos, que numa actividade recente dizia que o Executivo deixará de fornecer gratuitamente insumos, como fertilizantes e outros. No caso dos agentes da ENDE, mesmo depois de terem consumido energia, os consumidores não pagaram. E a brutalidade com que agiram nem sequer lhes criou qualquer constrangimento, como se não honrar com o pagamento fosse um bom comportamento, sobretudo não beneficiando de qualquer isenção.
Quanto aos beneficiários de fertilizantes, por exemplo, também já surgiram comentários menos abonatórios por conta desta medida, porque no passado o normal era que muitos se pudes- sem beneficiar, às vezes sem qualquer contrapartida para o Estado, que despende enormes somas.
Mesmo depois de Angola ter aderido ao multipartidarismo e à economia de mercado, a prática ainda foi – ou continua – apresentando evidências que se consubstanciam com práticas da economia centralizada. Onde se pensa que o Estado deve entregar de forma gratuita bens e serviços sem a contrapartida das pessoas, incluindo até aquelas que trabalham e ganham uma enorme fortuna.
Curiosamente, não se trata só de indivíduos que supostamente apresentam um nível de vida economicamente deficitário, mas também alguns com res- ponsabilidade a nível das principais instituições do Estado. É só olharmos para muitos dos que conseguiram apartamentos nas principais centralidades do país, entre as quais Kilamba, Sequele, Vila Pacífica e outras, que não pagam há muito tempo as rendas, alguns até desde que lá entraram.
Nãomeespantariasequersenestafasedocampeonato, em que muitos batem o peito por uma democracia cada vez mais acentuada, existissem outros com enormes saudades do período do cartão de abastecimento. Apesar do tempo, mais de 30 anos em regime democrático, o Estado de providência continua em muitos de nós.
Afugenta-nos das responsabilidades enquanto cidadãos, fazendo com que, não pagando serviços e taxas, não tenhamos mais, o que não permite que se aumente a qualidade e o acesso destes serviços a outros. Dirão alguns que se trata de falta de dinheiro. Mas, quando até os que têm não pagam, fica difícil defender o indefensável.