Nos últimos anos, muitas ONG’s têm enfrentado um paradoxo curioso: por um lado, denunciam a retracção de diversas empresas no apoio a iniciativas sociais; por outro, cresce o número de empresas que aderem ao Pacto Global das Nações Unidas, comprometendo-se com uma série de obrigações, entre as quais o reporte das suas actividades alinhadas à Sustentabilidade.
Face ao exposto, a questão que se coloca é: por que razão existe este desalinhamento interno, sendo que as ONG’s podem, no quadro da governaça, do ambiente e do social, facilitar em grande medida o trabalho das signatárias no que toca ao reporte? Como, então, as organizações sem fins lucrativos (OSFL) podem transformar em percepção a sua proposta de valor diante das empresas signatárias do Pacto Global, para verem-se apoiadas financeiramente na prossecução dos seus nobres objectivos? As ONG’s, por natureza, são instituições com uma forma de tratamento de informação sobre as comunidades, o ambiente e o social altamente especializada.
Dispõem de capacidade para facilitar o processo de reporte com impacto, fruto dos dados que colhem directamente dos territórios onde actuam. Contudo, no nosso país, o ecossistema legal que deveria incentivar práticas socialmente responsáveis continua incompleto, dada a ausência de uma Lei do Mecenato robusta, capaz de motivar as empresas a investirem na responsabilidade social e na sustentabilidade de causas locais.
A meu ver, a resposta reside, em grande parte, na forma como as ONG’s têm estruturado o diálogo com o sector privado. Durante décadas, a narrativa girou em torno da “responsabilidade social corporativa”, tratada quase como um gesto caritativo, uma extensão da filantropia empresarial. Mas o mundo mudou. Hoje, o léxico é outro: fala-se de Sustentabilidade e ESG. Já não se trata de doar cestas básicas ou patrocinar um evento; trata-se de alinhar o núcleo de negócios das empresas com critérios de impacto ambiental, inclusão social e transparência na gestão.
Muitas ONG’s, contudo, continuam a bater à porta das empresas com o mesmo discurso de sempre, centrado na caridade e na “responsabilidade social”. Esse vocabulário perdeu poder de mobilização. As empresas procuram métricas, relatórios e indicadores que demonstrem valor estratégico; querem saber como um projecto contribui para os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), melhora a reputação corporativa ou reduz a pegada ambiental.
Por outro lado, o quadro legal angolano ainda não favorece o investimento em causas sociais. A inexistência de uma Lei do Mecenato moderna ou de incentivos fiscais adequados cria um desincentivo objectivo, empurrando empresas a verem a responsabilidade social como um custo adicional e não como um investimento estratégico. Cabe, por isso, às ONG’s assumirem igualmente um papel de Relações Públicas, pressionando o Estado a criar um ambiente regulatório que premie as boas práticas. O desafio, portanto, é duplo: reinventar o discurso e reposicionar o papel institucional.
As ONG’s precisam de falar a linguagem técnica do ESG, traduzindo as suas acções em dados e resultados mensuráveis, e devem profissionalizar a comunicação institucional para apresentarem-se como parceiras de Sustentabilidade, co-criadoras de soluções, e não apenas receptoras de fundos. As empresas buscam propósito, mas também evidência. Querem impacto com alma, causas que inspirem e transformem.
E as ONG’s, se conseguirem combinar emoção e prova, terão o que hoje mais vale nas parcerias: confiança. O tempo da filantropia descomprometida terminou. A nova gramática é a da Sustentabilidade e só quem aprender a falá-la vai conseguir ser ouvido.
Por: AMADEU CASSINDA
Jornalista e Consultor de Comunicação Integrada









