Recentemente, durante um encontro organizado pela União Europeia, cujo nome não é importante, o ministro das Relações Exteriores de Angola, Téte António, foi impedido de usar a língua portuguesa na sua intervenção oficial. Ao diplomata angolano, foi imposta a exigência de falar apenas em inglês ou francês.
Sem jeito e bastante cabisbaixo, o embaixador Téte António não conseguia perceber o que tinha acontecido… Ainda assim, o ministro das Relações Exteriores da República de Angola seguiu com o discurso utilizando uma das opções apresentadas pela organização com as únicas línguas autorizadas no evento.
Para muitos, pode ter parecido um detalhe técnico, uma formalidade burocrática. Mas, na diplomacia, as formas são tão importantes quanto o conteúdo. E, neste caso, o gesto teve peso simbólico: negou-se a Angola o direito de se expressar na sua língua oficial, como se esse direito estivesse condicionado à conveniência de quem organiza o diálogo. A diplomacia, através do direito internacional, assenta-se em princípios que não podem ser ignorados.
O primeiro é o da igualdade soberana entre os Estados, consagrado no artigo 2.º, n.º 1 da Carta das Nações Unidas. O princípio da igualdade soberana ou princípio da igualdade entre os estados, como também é conhecido, estabelece que todos os estados são iguais em direitos e deveres no cenário internacional, independentemente de sua força política económica ou social. O que quer dizer que nenhum país é menor que outro e, neste sentido, nenhum idioma nacional deve ser considerado menos digno de ser ouvido. Outro princípio essencial é o do respeito mútuo.
O multilinguismo, longe de ser um obstáculo, é a base da convivência justa entre as nações. Permitir que cada Estado fale na sua língua oficial é reconhecer a sua história, a sua cultura, a sua identidade. É, sobretudo, garantir que todos sejam ouvidos de igual para igual. A língua portuguesa é falada por mais de 260 milhões de pessoas no mundo (3,7% da população mundial), sendo a quarta língua materna mais falada no planeta, depois do mandarim, inglês e espanhol.
O português é o idioma oficial de nove países soberanos, língua oficial ou de trabalho de 32 organizações internacionais, incluindo a União Europeia, o Mercosul, União Africana, a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), e várias agências e organismos das Nações Unidas. Ignorá- la num espaço multilateral é ignorar o peso de uma comunidade inteira. O que aconteceu com o embaixador Téte António não pode ser visto como um simples episódio. É um alerta. Uma democracia de nações começa pelo respeito à voz e à língua de cada uma.
Quando se impõe o silêncio a um idioma, calando um ministro no exercício pleno da sua função diplomática, não se está apenas a reduzir a diversidade. Está-se a ferir a essência da diplomacia. É hora de repensar as práticas multilaterais e garantir que a inclusão linguística seja uma prioridade, e não um detalhe ignorado nos corredores do poder. O respeito começa pela escuta. E escutar, em diplomacia, é também permitir que cada nação fale na sua própria língua.
POR: Adilson Machado
Jornalista