O procurador-geral de Espanha começa a ser julgado nesta Segunda-feira, em Madrid, por violação de segredo de justiça, num caso inédito no país e que atinge o governo de Pedro Sánchez e o executivo regional de Madrid
O julgamento de Álvaro García Ortiz, no Tribunal Supremo de Espanha, tem seis sessões marcadas até 13 de Novembro, revela a Lusa. O procurador-geral do Estado vai ser julgado por um delito de revelação de informações pessoais ou que estavam em segredo de justiça. Em Espanha, as alegações fazem-se antes do arranque do julgamento e as acusações pedem entre quatro e seis anos de prisão para o procurador, assim como proibição de exercer o cargo de chefe máximo do Ministério Público. Já o Ministério Público pede a absolvição do procurador-geral do Estado.
Em causa está a divulgação de emails e informações relacionadas com uma investigação por fraude fiscal que tem como alvo Alberto González Amador, o companheiro sentimental da presidente do governo regional de Madrid, Isabel Díaz Ayuso, do Partido Popular (PP, direita, principal força da oposição). As informações foram publicadas em meios de comunicação social e o Tribunal Supremo considerou, no despacho em que decidiu que haveria julgamento, que há indícios de ter sido o procurador-geral a divulgar “segredos de que podia ter tido conhecimento” por causa do cargo que ocupa.
Durante a investigação, jornalistas de diversos meios de comunicação social que publicaram as informações em causa negaram que a fonte tenha sido o procurador-geral e disseram que tinham tido acesso aos emails em causa antes de terem chegado ao próprio Álvaro Garcia Ortiz. Foi ainda ouvido um assessor da presidente do governo regional de Madrid, Miguel Ángel Rodríguez, que assumiu ter ele próprio partilhado informações sobre o caso com jornalistas.
Garcia Ortiz foi ouvido em 29 de Janeiro pelo Tribunal Supremo e negou ter divulgado informações em segredo de justiça. Ao longo dos oito meses da investigação, o procurador rejeitou sempre demitir-se e só assumiu a responsabilidade da divulgação de um comunicado à imprensa da Procuradoria em que desmentia notícias de jornais e esclarecia que o empresário Álvaro González Amador tinha proposto um acordo ao Estado e assim admitido que cometeu crimes.
Duas associações de procuradores, incluindo a que representa a maioria dos magistrados do Ministério Público, pediram a Álvaro García Ortiz para se demitir, considerando que “é a única forma de evitar um dano reputacional” à carreira e à instituição. Uma terceira associação considerou estar em causa a presunção de inocência e manifestou apoio à actuação do procurador-geral. Álvaro García Ortiz disse que ia continuar no cargo por estar convencido de que “é o menos gravoso e o mais prudente para a instituição Ministério Público a médio e longo prazo” e “com pleno respeito pela lei e pelo Estado de Direito”.
Realçando ser inédita a abertura de uma investigação ao procurador-geral, García Ortiz defendeu “uma profunda reflexão” sobre aquilo que a motivou e “as circunstâncias que a rodeiam”.
O procurador lembrou que a lei espanhola atribui ao Ministério Público a função de informar sobre os assuntos relevantes que conhece para garantir o direito dos cidadãos a informação fidedigna, “mais ainda num caso como este, em que boatos ou falsidades comprometiam a imagem da instituição e de vários dos seus membros”.
O caso tem motivado troca de acusações entre o Governo, liderado pelos socialistas, e a oposição, com o PP a pedir reiteradamente a demissão do procurador, que é nomeado por escolha do executivo.
“A degradação institucional a que Pedro Sánchez primeiro-ministro submete o nosso país é insuportável. Se o PSOE [Partido Socialista] não exige a demissão de Álvaro García Ortiz, vai acompanhá-lo até ao banco dos réus”, escreveu o líder do PP, Alberto Núñez Feijóo, na rede social X.
Já o Governo, reiterou o apoio ao procurador: “Sempre fomos conscientes de que o procurador-geral do Estado defendeu a verdade e perseguiu o delito, portanto, todo o respeito por esta resolução do juiz e também toda a confiança no procurador-geral do Estado”, disse a porta-voz do executivo, a ministra Pilar Alegria.
Foram chamadas a testemunhar no julgamento de García Ortiz perto de 40 pessoas, incluindo procuradores do Ministério Público, jornalistas, assessores do governo regional de Madrid e do Governo de Espanha e um antigo dirigente do Partido Socialista espanhol em Madrid









