O desporto escolar tem vindo a atravessar um momento conturbado por conta da falta de infra-estruturas. Essa prática ainda é uma miragem, pois os professores de educação física ouvidos por este jornal criticaram as autoridades competentes por desvalorizar a base do desporto federado
O desporto escolar desempenha um papel crucial na formação integral de crianças e jovens, funcionando como uma extensão do processo educativo.
Além de promover saúde e bem-estar, o desporto é fundamental para a criação de hábitos saudáveis e para a descoberta de talentos.
Contudo, em solo angolano, o panorama do desporto escolar é preocupante, com diversos desafios que comprometem sua eficácia e potencial.
A realidade enfrentada por muitos estudantes angolanos é marcada pela falta de infra-estruturas adequada para a prática da educação física.
Infelizmente, muitos espaços que antes eram utilizados para actividades desportivas foram ocupados por empresas que não trazem benefícios ao desporto.
Essa situação reflecte uma falta de priorização do desporto escolar por parte das autoridades competentes, neste caso, do Ministério da Educação.
Na verdade, a ausência de incentivos para a prática da educação física é outro ponto crítico, sendo que os programas destinados à dinamização das actividades desportivas são praticamente inexistentes.
Tal situação tem deixado os alunos sem oportunidades para se envolverem em competições ou mesmo em treinamentos regulares.
Durante uma ronda efectuada pelas escolas da capital angolana, este jornal constatou condições alarmantes para a prática da educação física.
Muitas instituições não possuem espaços adequados para modalidades como basquetebol, andebol ou voleibol.
Em alguns casos, as estruturas estão deterioradas, com fissuras visíveis e tapetes impróprios que colocam em risco a integridade física dos alunos.
Os Ministérios da Juventude e Desportos e da Educação têm-se mostrado ineficazes na implementação de acções concretas que visem melhorar essa situação.
Além disso, a massificação do desporto escolar continua a ser um sonho, segundo os professores ouvidos por este jornal.
Para que o desporto seja efectivamente integrado ao dia a dia dos estudantes, é necessário um esforço conjunto entre as instituições governamentais e as escolas.
A criação de campeonatos interescolares mais frequentes poderia, verdadeiramente, incentivar a participação dos alunos e fomentar o espírito competitivo saudável.
Não há dúvidas de que a formação de professores capacitados em educação física também é importante para garantir que os alunos recebam orientações adequadas durante as aulas.
O director da Juventude e Desportos do governo provincial de Luanda, Ernesto André, mostrouse ontem satisfeito com a situação actual do desporto escolar a nível nacional, destacando os avanços significativos que têm sido observados nos últimos anos.
Para o responsável, a massificação do desporto escolar continuará a ser uma prioridade para o seu pelouro, ressaltando que continuará a trabalhar com o Gabinete Provincial da Educação para o desenvolvimento deste sector.
“Estamos satisfeitos com o progresso que temos feito e continuaremos a trabalhar juntos para fortalecer ainda mais o desporto escolar”, disse.
Direcção da Juventude e Desportos
O professor de educação física do Instituto Politécnico Administração e Gestão do Luena, Catarino Oliveira, considerou negativo o estado actual do desporto escolar, destacando a carência de material desportivo nas demais instituições do país.
Além disso, explanou que a falta de infra-estruturas é um dos problemas mais graves enfrentados pelas instituições de ensino.
“Estamos com escolas sem espaços adequados para a prática da educação física”, começou por apontar, tendo ressaltado “a necessidade urgente de se criar ambientes propícios para o desenvolvimento da actividade física”.
Observou que em várias províncias existem professores que lecionam educação física sem a formação necessária, o que compromete a qualidade do ensino e da prática esportiva.
“Estamos mais preocupados com o sucesso imediato do que com o desenvolvimento de jovens que poderão se tornar uma mais-valia para nossas selecções no futuro”, lamentou.
Afirmou que devem ser feitas mudanças profundas para o bem-estar do desporto nacional, isto é, com formações e incentivos.
“Precisamos capacitar nossos professores e investir na formação contínua deles. Também devemos incentivar os professores.
Não tem sido fácil”, destacou. Catarino Oliveira prosseguiu: “Na escola onde leciono, só temos o recinto, mas sem material desportivo”, explicou.
O professor não hesitou em mencionar que muitas vezes ele e seus colegas têm utilizado seu próprio material para ensinar.
“Usamos o nosso material para dar as aulas. É muito triste. Assim não iremos a lugar nenhum”, considerou. Catarino Oliveira espera que o Ministro da Educação tome medidas concretas para reverter o actual quadro em que se encontra o desporto escolar.
“Se não cuidarmos da base, não poderemos esperar resultados positivos nas selecções no futuro”, argumentou.
José Manuel: “Ainda temos escolas sem espaços para a prática da educação física”
O professor de educação física do Instituto Médio de Economia de Luanda (IMEL), José Manuel, afirmou que a disciplina de educação física ainda não é uma realidade em várias escolas da província de Luanda.
José Manuel lamentou a ausência da educação física nas instituições de ensino, afirmando que essa situação é “triste” e representa um risco para o futuro do desporto nacional. “Estamos a matar o futuro do nosso desporto. É preciso agir”, assinalou.
O professor também criticou a precariedade das instalações desportivas disponíveis nas escolas. Uma das preocupações expressas por José Manuel foi a importância de investir nas relações humanas antes mesmo dos bens materiais.
Disse não ter dúvidas de que a formação de professores qualificados e a construção de um ambiente colaborativo são fundamentais para o crescimento do desporto escolar.
Além disso, observou que as competições entre as escolas têm diminuído ao longo dos anos. “Há 15 anos tínhamos um calendário robusto de competições, mas agora está raro. Não há valorização”, lamentou.
Neste sentido, enfatizou que é essencial reverter essa tendência negativa, investindo tanto na infraestrutura quanto na formação contínua dos professores.
“Se não cuidarmos da base, estaremos comprometendo o futuro dos nossos atletas”, concluiu o professor, deixando claro que o investimento no desporto escolar é vital para garantir um desenvolvimento saudável e competitivo das novas gerações.
Apesar das dificuldades enfrentadas em muitas escolas, José Manuel destacou que no IMEL a realidade é diferente. “Aqui não temos problemas; temos todas as condições para realizar nossas atividades”, afirmou.
Virgílio Cardoso: “Há uma desvalorização gritante da prática da educação física”
O presidente da Associação dos Professores de Educação Física, Virgílio Cardoso, considerou que a disciplina de educação física tem vindo a ser negligenciada nas escolas do país.
Fez questão de destacar a falta de condições de trabalho para os professores de educação física, que se veem desamparados frente à indiferença de muitos gestores escolares. “Não estamos bem.
A valorização das aulas de educação física ainda é uma meta distante”, começou por dizer. Um dos principais problemas apontados por Virgílio Cardoso tem a ver com a carência de espaços adequados para a realização das aulas.
Lembrou que essa questão não é nova e que as gestões passadas falharam em considerar a importância dessas áreas na construção de novas escolas.
Embora haja uma tendência actual de incluir espaços para educação física, sublinhou que o número de instituições sem essas infra-estruturas continua a tirar o sono aos fazedores desta actividade.
Além disso, o presidente da associação denunciou que muitos espaços escolares têm sido ocupados por actividades que não correspondem à educação física. Essa prática, acrescentou, se espalha por todo o país e compromete ainda mais as oportunidades para que os alunos se envolvam em actividades desportivas.
Virgílio Cardoso enfatizou a importância de valorizar a educação física não apenas como um meio de promover o desporto escolar, mas também como um pilar fundamental para a saúde dos cidadãos. Disse que a intersecção entre educação física e saúde pública deve ser uma prioridade nacional.
O responsável fez um apelo para que o Ministério da Saúde se envolva mais activamente nas questões relacionadas à educação física. “O principal interessado na educação física não deve ser apenas o Ministério da Educação ou dos Desportos”, afirmou.
Nesta sequência, referiu que a falta de material desportivo adequado nas escolas foi outro ponto crucial levantado pelo professor, tendo explicado que sem os recursos necessários, os professores e alunos são impedidos de desenvolver plenamente suas capacidades e talentos. A intervenção do Ministério da Educação é considerada urgente por Cardoso.
Ele acredita que apenas com ações concretas será possível transformar o cenário atual e garantir melhores resultados nas seleções esportivas do país.
“Podemos nos alegrar com alguns resultados pontuais, mas nunca chegaremos ao patamar de outros países se não melhorarmos esse setor”, finalizou.
Por: Kiameso Pedro