O lançamento oficial do volume III do livro intitulado “Os Bantu na Visão de Mafrano’’ foi realizado nesta terça-feira, 12, às 16 horas, no auditório da Escola Nacional de Administração e Políticas Públicas (ENAPP). A obra retrata a civilização bantu, temas sociais e episódios vividos na era colonial, numa visão profunda e reflexiva do nacionalista e escritor Mafrano
Mais de quarenta anos após a sua morte, é apresentado ao público o terceiro volume da colectânea póstuma “Os Bantu na Visão de Mafrano- Quase memórias”, do escritor e etnólogo Maurício Francisco Caetano, de pseudónimos literário “Mafrano” ou “Anateco “, cuja tarefa de conclusão da obra e o seu lançamento coube ao filho, que também é escritor.
O acto de lançamento, realizado na ENAPP, em Luanda, contou com a participação de escritores, representantes de entidades religiosas, amigos, contemporâneos, familiares, instituições públicas, privadas, instituições culturais, estudantes, académicos, especialistas na matéria e público em geral.
Composto por 800 páginas e mais de 28 capítulos, a obra é resultado de temas e textos publicados pelo malogrado, enquanto colaborador dos extintos jornal Apostolado, Revista Angolense, O Angolense, Tribuna dos Musseques, entre outros exemplares do século XX.
Os temas da obra são também reforçados por dados e testemunhos de fontes de Moçambique, RDC e outros países. Ao falar em nome da família, o filho e autor do projecto familiar, José Caetano, considerou que o lançamento do terceiro volume III do livro representa um sentimento de dever cumprido, e um gesto de preservação e continuidade do legado do pai.
Fez saber que começou a compilar os textos deixados pelo pai em 2011 e só este ano conseguiu concluir e assim tomar a liberdade de a levar a uma editora para a devida publicação. “Foi uma trajectória grande, muito esforço, trabalho, pesquisa, muitas horas sem dormir, mas valeu a pena. É um sentimento de alegria enorme. É um trabalho extraordinário e muito rico“, disse.
O mesmo, que protagonizou a sessão de autógrafo, apelou a sua progenitora para recuperar as obras literárias do seu pai espalhadas por vários cantos do país e dar continuidade ao legado deixado pelo nacionalista, político e escritor.
Sentimento de dever cumprido Orgulhoso por conseguir concluir o sonho do seu pai, apesar de já passados cerca de quatro décadas desde a sua morte, João Caetano frisa que valeu a dedicação da família no sentido de colocar a obra à disposição do público.
“E não foi em vão que a obra recebeu, em 2024, o Prémio Nacional de Cultura e Artes, numa altura em que a colectânea ainda não tinha terminado”, ressaltou.
José Caetano dedicou aos familiares, a todos os angolanos e a humanidade em geral, considerando tratar-se de um livro que não tem fronteiras em termos de ensinamentos.
A composição do livro, salientou, contou com o apoio e intervenção dos amigos do malogrado, contemporâneos e outras pessoas que já tiveram contacto com o etnólogo Maurício Francisco Caetano e/ ou com os seus ensinamentos.
Mafrano respeitava e preservava a cultura africana
O filho ressaltou que a obra retrata aspectos fundamentais da cultura dos povos bantus, numa altura em que a cultura local, bem como a língua falada, não era reconhecida e nem aceites pelo colono europeu.
Num contexto em que os conservadores da cultura e da tradição eram discriminados, segundo João Caetano, Mafrano teve a coragem de defender e quando os alguns povos chamavam os outros de indígenas dizia que “cada povo era indígena na sua própria terra”.
A fonte destacou que a convivência de Mafrano com a família era bastante saudável, frisando que era um pai presente, que estimulava sempre o gosto pela leitura no seio familiar e se preocupava com a formação dos filhos.
Emocionado, recordou alguns momentos de convívio ao lado do pai e de outros familiares, especialmente os momentos de leitura e da partilha de conhecimento que era um gesto característico do seu progenitor.
Sobre o autor
Maurício Francisco Caetano “Mafrano” nasceu no Dondo, Lunda Norte, em 1916. Foi na sua terra natal onde completou o ensino primário. Filho de Francisco João Caetano, alfaiate de profissão, natural de Cambambe, e de Mariana José Marcolino, também do Dondo, iniciou os seus estudos no Seminário de Luanda, onde frequentou Filosofia e Teologia.
Mafrano começou a sua carreira como aspirante administrativo, conciliando esta função com o ensino e a promoção da antropologia social angolana.
Trabalhou nos Serviços de Fazenda e Contabilidade durante o período colonial, que após a independência de Angola, em Novembro de 1975, passaram para o Ministério das Finanças, onde assumiu o cargo de director, função que manteve até à sua morte em 1982.
Enquanto escritor, colaborou com várias publicações, entre elas O Apostolado, Revista Angola, O Angolense e Tribuna dos Musseques, assinando com os pseudónimos “Mafrano” e “Anateco”.
Dom Filomeno destaca Mafrano como “um bom fiel” da Igreja Católica
A responsabilidade da apresentação da obra esteve a cargo do arcebispo de Luanda, Dom Filomeno Vieira Dias, líder máximo da igreja Católica que, na sua intervenção, recordou com “ternura e nostalgia” a pessoa de Mafrano, que, segundo fez saber, foi um fiel católico exemplar.
Dom Filomeno Vieira Dias disse que Maurício Francisco Caetano era um homem muito religioso, fervoroso na sua fé, independente das funções que ocupava, quer no governo, quer na sociedade civil.
“Mafrano nunca dormiu à sombra da palmeira, mas sempre lutou e defendeu com todas as suas forças o bem dos seus a todos os níveis”, recordou o bispo.
O arcebispo considerou que a coletânea representa a irreverência do homem e os desafios da sua época, salientando que os ensinamentos nunca expiram, têm sempre valor em qualquer etapa da vida.
O líder da Igreja Católica na capital aproveitou a ocasião para apelar aos presentes a uma reflexão sobre os 50 anos de Independência que o país está a celebrar, olhando para o passado como referência para a construção de um futuro próspero para todos os filhos desta nação.