O correu no último fim-de-semana, em Luanda, o 1.º Simpósio Nacional do Kuduro, um evento que reuniu artistas, produtores, investigadores, académicos e representantes de instituições culturais e entidades governamentais para discutir e reflectir sobre vários assuntos inerentes ao estilo musical, como forma de valorizar o kuduro como parte da identidade cultural angolana
Organizado pela Associação dos Kuduristas de Angola (AKA), o evento, que aconteceu na última sextafeira, 15, no Hotel de Convenções de Talatona, em Luanda, abordou temas como a profissionalização do kuduro, a preservação de sua autenticidade e seu potencial como ferramenta de inclusão social e projeção internacional.
Entre as discussões que centralizaram o certame, o destaque recaiu para a “exigência” de elevação do Kuduro a património nacional da cultura, à semelhança de outros estilos musicais como a Kizomba e o Semba.
Neste quesito, os kuduristas foram unânimes a defender que a elevação do estilo a esta categoria vai representar um passo importantíssimo na preservação e valorização do estilo.
Fofandó, uma das artistas mais conceituadas deste estilo musical, defendeu que o estilo precisa de mais valorização, de mais espaço e mais expressão no cenário cultural nacional, e que a sua elevação seria um passo significativo neste sentido.
“Isso vai ajudar a valorizar mais o estilo e também os próprios kuduristas. E vou aproveitar a ocasião para apelar ao ministro da Cultura que preste um pouco mais de atenção aos kuduristas porque muitas vezes somos colocados muito de parte e isso não engrandece a nossa cultura”, disse a artista.
Sendo a primeira mulher a fazer o estilo, Fofandó foi prestigiada, durante o evento, com a carteira profissional de artista, um gesto que a mesma agradeceu e considerou ser um sinal de que o seu trabalho tem dado um importante contributo na cultura nacional.
A mesma não escondeu a satisfação e o entusiamo pela carteira e apelou para que iniciativas do gênero sejam realizadas com mais regularidade. “Fico muito grata por esta carteira, é algo que acho que devia ter faz tempo, mas recebendo hoje ainda assim sinto-me honrada e grata por este gesto.
O kuduro é mesmo nosso, são 30 anos de Kuduro e eu gostaria que iniciativas do gênero não parassem por aqui, que venham mais simpósio, mais eventos para reflectirmos sobre este estilo que é de todos os angolanos”, expressou.
Também presentes no evento, os kuduristas Príncipe Ouro Negro e Puto Lilas defenderam igualmente a elevação do estilo a património da cultura nacional, assim como a profissionalização da classe, advertindo para a necessidade de se olhar para os direitos autorais com seriedade. “Nós, os kuduristas, é que saímos a vencer com esta elevação.
Temos que estar unidos e perceber o que está a ser discutido neste evento para depois começarmos a pôr em prática, porque realmente tem muitos pontos em que estamos em falta e precisamos de orientações para melhor nos posicionarmos”, defendeu Puto Lilas.
Reforçou ainda a necessidade de haver debates e encontros do gênero para orientar os artistas a se posicionarem e tomarem conhecimentos sobre matéria também ligada aos direitos autorais. “Já tivemos exemplo vivo de um colega nosso cuja música foi registada por um brasileiro e ele teve que correr atrás desta pessoa para poder usufruir dos direitos autorais de um trabalho que é cem por cento de autoria dele”, frisou.
Por sua vez, Príncipe Ouro Negro destacou a importância de se conhecer a história do kuduro, a sua essência e quem foram os seus precursores para que as novas gerações de artistas saibam direcionar-se na linha certa do estilo.
Reconheceu avanços no estilo, mas também manifestou preocupação com a banalização do género musical que, segundo afirma, devido a “arruaceiros que fingem ser kudristas” o kuduro tem sido muitas das vezes associados a práticas de marginalização, arruaça e vandalismo.
30 anos de Kuduro: reflectir a história e projectar o futuro
Ao falar sobre a razão da realização do simpósio, o presidente da Associação dos Kuduristas de Angola (AKA), Albino Inglês, artisticamente conhecido como “B-Black”, explicou que o certame visa, acima de tudo, criar um espaço de reflexão e aprendizagem sobre a história do estilo musical que neste ano está a celebrar 30 décadas de existência.
B-Black referiu que é através do conhecimento da história, da sua gênese que se irá projectar o futuro do estilo e da classe artística, acrescentando que se pretende também levar as discussões a volta do kuduro para as universidades e academias de arte.
“Queremos nós hoje dar o ponto de partida conciliando a história e as produções discográficas com aquilo que se fez ontem e ao que se faz hoje, para podermos projectar o futuro e levarmos as discussões aos grandes estudiosos da academia para olharem para o estilo como um objecto de estudo e de pesquisa”, afirmou.
Outrossim, avançado pelo atrista como razão do simpósio, está na preparação de bases sólidas e concretas que vão sustentar o processo de elevação do estilo a património cultural nacional.
“E foi bom hoje termos esta iniciativa porque o ministro (da Cultura) deixou-nos algumas orientações que já estamos aqui a cumprir para se poder elevar o kuduro a património da nossa cultura nacional”, precisou.
Participaram do simpósio mais de 150 kuduristas, entre veteranos e nova geração, com realce para a participação do músico Sebem, considerado um dos ícones e percursores do Kuduro.
Em gesto de reconhecimento pelo seu contributo, Sebem recebeu da mão do ministro da Cultura, Filipe Zau, a carteira profissional de artista, documento que o acredita legal e oficialmente como artista, dentro e fora de Angola.