O avanço da odernização trouxe conforto, mas afastou as famílias do essencial: o tempo e o afecto partilhado. Vivemos numa era marcada pela velocidade. Os avanços tecnológicos, a pressão laboral e o ritmo frenético da vida urbana têm vindo a alterar de forma significativa a dinâmica das relações familiares. Gestos outrora simples, como reunir-se à mesa para partilhar uma refeição, tornaram-se, em muitas casas, raridades quase nostálgicas.
A convivência familiar — pilar da formação social e emocional — tem sido substituída por compromissos externos e distracções constantes. Não se negam os benefícios da modernidade. Ela trouxe conforto, acesso à informação e novas oportunidades.
No entanto, também nos afastou de algo essencial: o tempo de qualidade com aqueles que mais amamos. O sociólogo Zygmunt Bauman alertava para a fragilidade dos laços humanos contemporâneos ao afirmar: “As relações humanas são cada vez mais líquidas. Nada é feito para durar” (Bauman, 2004, p. 8). Essa liquidez traduz-se, muitas vezes, na desestruturação silenciosa das famílias.
A realidade das capitais provinciais angolanas ilustra bem esse fenómeno. Pais e filhos partilham o mesmo tecto, mas vivem isolados nos seus próprios mundos digitais. O contacto físico é substituído pelo virtual.
Há progenitores que não sabem sequer o nome completo dos filhos, as suas datas de nascimento ou a turma que frequentam. Casais mal conseguem manter uma conversa significativa ou reservar um momento para estarem juntos, como alerta Maria Montessori: “A primeira tarefa da educação é agitar a vida, mas deixá-la livre para se desenvolver” (Montessori, 2002, p. 93). Mas como desenvolver-se num ambiente onde faltam presença e diálogo? As tradições familiares, outrora base da convivência, vão sendo abandonadas.
A escuta atenta, a partilha de histórias, a expressão dos afectos — tudo vai sendo empurrado para segundo plano. A afectividade, que se manifesta no olhar, no toque e na escuta empática, perde espaço num quotidiano dominado por silêncios e pressas. E quando a família deixa de ser refúgio, o impacto reflecte-se directamente no comportamento de adolescentes e jovens.
Muitos pais acreditam que o seu papel resume-se a garantir sustento material: alimentação, vestuário e educação. No entanto, educar vai muito além do fornecimento de recursos.
“Educar é impregnar de sentido o que fazemos a cada instante”, afirmava Paulo Freire (1996, p. 22). Isso exige tempo, envolvimento e presença — não apenas meios financeiros. Infelizmente, há lares que mais se assemelham a pequenas ilhas. Falta diálogo, empatia, convivência. E, na ausência do vínculo afectivo, cresce-se carente, inseguro, distante de si e dos outros.
Augusto Cury sublinha que “os filhos não precisam de pais perfeitos. Precisam de pais humanos que saibam dizer ‘eu errei’, que saibam dialogar e ensinar pelo exemplo” (Cury, 2003, p. 65). Não há soluções milagrosas para recuperar o que foi perdido.
Mas há caminhos. O primeiro é compreender que a convivência familiar não é imposta — cultiva-se. E, como tudo o que se cultiva, exige cuidados diários: paciência, presença, afecto. Urge reaprender a conviver, a olhar nos olhos, a ouvir com o coração.
A maior herança que os pais podem deixar aos filhos não está nos bens materiais, mas na memória de um lar onde foram amados, ouvidos e respeitados. Um espaço de crescimento, partilha e afecto. No final, são esses momentos — simples, mas carregados de significado — que moldam a visão de mundo das novas gerações. Mais do que nunca, é imperativo resgatar os valores que fortalecem o núcleo familiar.
Promover momentos de união, diálogo sincero e escuta mútua. Estar presente é mais do que partilhar o mesmo espaço físico: é estar disponível, atento, emocionalmente acessível. Criar tempo para o outro, num mundo acelerado, é hoje um acto revolucionário. E talvez, seja este o primeiro passo para reconstruir famílias mais coesas, amorosas e verdadeiramente humanas.
Por: Ludijúnior Dias Sebastião









