Nesta semana vivi um déjà-vu, quando numa conversa iniciada pelo meu filho (Emílio José), de 8 anos, com seriedade na expressão facial, perguntou, “Pai, por que é que os negros são feios” fazendo referência a uma informação recebida de um colega do colégio, que lhe terá dito ser o jogador Kyliam Mbappé, mais “bonito” que o colega da seleção francesa, N`Golo Kanté.
A pergunta do meu filho que é legitima em fase do seu desenvolvimento cognitivo, levou me a voltar a época dos meus 6/7/8 anos, quando frequentava o bairro Gika, na periferia de Cabinda, na época o centro de maior afluência de emigrantes provenientes da Republica Democrática do Congo, como um déjà-vu do período, a conversa com o meu filho fez voltar a memoria do famoso Mecacon, um tipo de sabonete clareador que era uma espécie de tabua de salvação usada pelos irmãos da RDC, para fugir a “pretitude” e atingir a “branquidade”, porque o entendimento destes era que ser preto representava o espectro de inferioridade, diferente de ser branco ou ter um colorir aproximado, o vulgo mulatos e mulatas, maior objectivo destes, que olhavam com Idolatria aos artistas Koffi Olomide e Defao, por estes já terem atingido o maior desejo de ser “ descolorido”.
Entre tantas razões ou motivações que me levaram à memória da convivência com os manos da RDC no final dos 90, percebi que hoje passou a ser normal buscar por mecanismos para ter o tom de pele mais claro, uma condição notável nos adolescentes que passaram a queimar os lábios com produtos nocivos à saúde e sem qualquer orientação médica.
Essa realidade encontramos em toda parte do continente ou vulgo “África Negra”, que naturalizouse a “descolorização”, e está mais evidente na televisão, internet, quando vimos uma figura pública que anteriormente aparentava ser negro com o tom de pele escura e como mágica, hoje passou para negro de tom da pele clara, certamente há quem poderá colocar aqui o tipo de produtos de estética, criado especificamente para alteração a colorização negra, usado como maior influenciador desta feita, eu não assumo tal narrativa, pois intendo que a maior influência está na mentalidade, propriamente no facto de ser cada vez mais patente que o africano ainda tem dificuldades com a auto-aceitação, factor crucial para definição do bem-estar emocional e físico.
As discussões que ainda assistimos nas empresas, escolas e outros meios sociais sobre ter cabelo ou não para definição do padrão de beleza, é claro informe da nossa fraqueza e falta de inteligência emocional quanto ao posicionamento e aceitação das nossas feições naturais como africanos. A cada dia perdemos o direito de sorrir, falar e até de nós amarmos como povo, tudo porque ainda não nos aceitamos e nos auto-mutilamos mentalmente.
Existe uma barreira bem visível que nos divide “a síndrome da colonização” que mesmo depois das correntes quebradas ainda é visível que mentalmente estamos acorrentados aos aspectos da feição e de uma cultura da auto-imposição.
Para o africano ser bonito é não ser africano, porque, tal como o colega de colégio do meu filho aprendeu “O negro americano e europeu”, por cá, é visto como branco. Infelizmente, é assim que seguimos com a “descolorização” e o conceito de beleza africana. O meu conselho é: aceita o teu tom da pele e a tua cultura; os teus filhos não merecem viver essa confusão sobre a própria identidade.
Por: Emílio José
Psicólogo | Jornalista |









