A abertura da Sétima Cimeira União AfricanaUnião Europeia, que decorreu em Luanda, nos dias 24 e 25 de Novembro de 2025, marcou um momento de reflexão profunda sobre o papel de África e da Europa na definição de um multilateralismo eficaz, capaz de responder aos desafios globais contemporâneos.
Acompanhei atentamente os discursos dos líderes dos dois blocos continentais e propôsme analisar/opinar sobre o discurso do Presidente de Angola e Presidente em exercício da União Africana, João Lourenço, que destacou não apenas a hospitalidade e simbolismo de Luanda, mas, sobretudo, as prioridades estratégicas do continente africano para os próximos anos, no contexto de cooperação com a União Europeia.
João Lourenço enfatizou durante a sua alocação a importância de consolidar paz, segurança e estabilidade como fundamentos imprescindíveis para o desenvolvimento económico, a integração regional e o empoderamento da juventude e das mulheres. Nesse sentido, a cimeira não se limita a um exercício diplomático formal, mas constitui um espaço para alinhar políticas e mecanismos de cooperação que possam gerar impacto concreto no crescimento económico, na criação de emprego e na redução da pobreza.
O Presidente recordou o papel histórico da parceria UA-UE ao longo de 25 anos, destacando avanços significativos em áreas como comércio, investimento, educação, saúde, ação climática e transformação digital, enquanto apontava para a necessidade de uma ação mais pragmática, eficiente e orientada para resultados tangíveis.
No plano económico, Lourenço sublinhou que África dispõe de recursos estratégicos – matérias-primas, terra arável, recursos hídricos e energéticos abundantes, e uma população jovem e crescente – enquanto a Europa oferece know-how, tecnologia e capital financeiro.
A complementaridade destes activos, segundo o Presidente, deve ser canalizada para uma cooperação mutuamente benéfica, promovendo industrialização, infraestrutura, conectividade digital e transição energética. Iniciativas como o Global Gateway e o Corredor do Lobito foram citadas como exemplos concretos de projectos capazes de fortalecer a integração económica regional e continental, fomentar comércio na Zona de Livre Comércio Continental Africana e criar condições para investimentos estratégicos em setores produtivos.
O discurso também evidenciou uma perspectiva crítica e realista sobre o sistema financeiro internacional. Lourenço defendeu a necessidade de mecanismos de financiamento mais justos, incluindo reestruturação da dívida, alocação de direitos especiais de saque e instrumentos inovadores de financiamento, para permitir que os países africanos invistam no seu próprio desenvolvimento sem depender exclusivamente de doações externas.
Esta abordagem demonstra uma compreensão clara das interdependências globais e do papel que a cooperação euro-africana deve ter na promoção de autonomia económica e social de África.
Do ponto de vista social e ambiental, o Presidente enfatizou a necessidade de políticas que fortaleçam a formação profissional e a empregabilidade da juventude africana, bem como o combate à desertificação e à degradação ambiental, aproveitando os recursos naturais para produção de energia limpa e sustentável. Lourenço alertou ainda para a urgência de enfrentar os efeitos das alterações climáticas, sublinhando que África, apesar de ser o continente que menos emite gases de efeito estufa, possui um enorme potencial para contribuir positivamente na mitigação dos efeitos globais do aquecimento planetário.
Politicamente, o discurso reforçou a importância de multilateralismo eficaz e inclusivo, em que a voz africana seja ouvida e respeitada na reforma das instituições internacionais. Lourenço destacou que a estabilidade global depende da obediência aos princípios da Carta das Nações Unidas e do direito internacional público, condenando ações unilaterais de grandes potências que desrespeitam a soberania dos Estados e colocam em risco a paz mundial.
O discurso do Presidente da República e Presidente em Exercícios da UA reflecte uma visão estratégica clara: África não procura caridade, mas uma parceria baseada em reciprocidade, respeito e benefício mútuo, capaz de traduzir recursos naturais, capital humano e investimentos tecnológicos em progresso social e económico sustentado.
A União Europeia, por sua vez, ganha ao se associar a um continente com potencial inexplorado, acesso a matérias-primas críticas e mercados emergentes, contribuindo simultaneamente para reduzir fluxos migratórios irregulares e promover estabilidade regional.
Em suma, a Sétima Cimeira UAUE em Luanda, tal como delineada por João Lourenço, evidencia que África pretende assumir um papel activo e propositivo na governança global, defendendo um modelo de desenvolvimento integrado, sustentável e inclusivo, que possa servir de referência para parcerias intercontinentais equilibradas. Se os compromissos assumidos forem acompanhados de implementação eficaz, transparência e monitorização rigorosa, Luanda 2025 poderá marcar o início de uma era de cooperação verdadeiramente transformadora, em que África e Europa construam juntos um futuro de paz, prosperidade e resiliência.
Por: Kateve BAMBI
Jurista I Teólogo I TADS I Analista Político e Social.









