O avanço tecnológico está a redesenhar a arquitetura dos sistemas fiscais em todo o mundo. No coração dessa transformação, a Inteligência Artificial (IA) emerge como uma ferramenta estratégica capaz de revolucionar a forma como os Estados arrecadam receitas, combatem a fraude e interagem com os contribuintes.
Em Angola, a Administração Geral Tributária (AGT) tem trilhado um caminho progressivo de digitalização, com plataformas como o Portal do Contribuinte e o Sistema Integrado de Gestão Tributária (SIGT).
Contudo, apesar dos progressos alcançados, a aplicação da inteligência artificial ainda não é uma realidade concreta. O país encontra-se numa fase préIA, caracterizada pela automação de processos e cruzamento de dados electrónicos, elementos fundamentais para a transição futura rumo a uma fiscalização tributária verdadeiramente inteligete.
1 . O estágio atual da AGT: automação e bases para a IA De acordo com declarações recentes de técnicos da AGT, a instituição já opera com sistemas automatizados que permitem identificar incoerências nas declarações fiscais, emitir alertas automáticos e cruzar dados de contribuintes.
As facturas electrónicas e os mecanismos automáticos de retenção na fonte representam uma evolução significativa em direção à transparência e eficiência fiscal. Todavia, essas ferramentas ainda não configuram inteligência artificial plena, mas sim automatização programada, uma etapa essencial que prepara o terreno para o uso futuro de algoritmos inteligentes baseados em machine learning e big data analytics.
2 . Desafios técnicos e jurídicos para a implementação da IA A transição da automação para a inteligência artificial exige infraestruturas tecnológicas robustas, formação especializada e segurança jurídica. Entre os principais desafios estão:
• A necessidade de garantir a proteção de dados pessoais, conforme a Lei n.º 22/11, de 17 de junho; • A criação de um enquadramento legal para o uso de algoritmos na fiscalização;
• A capacitação dos quadros da AGT para lidar com sistemas baseados em aprendizagem automática. Sem uma governança digital sólida, a adopção da IA poderia levantar questões éticas e de transparência, nomeadamente sobre como os algoritmos tomam decisões e quais dados são utilizados.
3 . Passos futuros e perspectiva regional O Governo angolano, no âmbito do Programa de Reforma da Administração Fiscal e Aduaneira (PRAFA), já anunciou a intenção de integrar, gradualmente, ferramentas de IA e análise de risco preditiva. O objectivo é fortalecer o combate à evasão, aumentar a eficiência fiscal e optimizar a arrecadação.
No contexto regional, Angola ainda está a construir as bases para esta evolução. • A África do Sul e as Maurícias já aplicam sistemas de IA fiscal, com modelos que identificam automaticamente padrões de fraude.
• A Nigéria: desde 2024, iniciou testes com algoritmos de aprendizagem automática para analisar declarações fiscais e mapear riscos de evasão. Face a esse cenário, Angola encontra-se numa posição estratégica, em que a modernização institucional e digital dos dados a chamada fase pré-IA, constitui o passo necessário antes da adopção integral de soluções inteligentes.
A implementação da inteligência artificial na fiscalização tributária não é apenas uma tendência tecnológica, é uma mudança de paradigma. Representa o início de uma nova era em que o Estado se torna mais analítico, preventivo e transparente, e o contribuinte, mais consciente e participativo.
Angola está a dar os primeiros passos firmes nessa direcção, consolidando a digitalização e preparando as fundações legais e técnicas para o salto seguinte. O desafio não é apenas tecnológico: é ético, humano e institucional.
A inteligência artificial deve ser colocada ao serviço da justiça fiscal, garantindo que a eficiência arrecadatória caminha lado a lado com a equidade, a protecção de dados e a confiança pública. Mais do que um instrumento, a IA será quando chegar o seu tempo, um espelho da maturidade fiscal de Angola, reflectindo a capacidade do país de transformar inovação em governança e tecnologia em transparência.
Por: MARIA DE MOURA









