Ao escrever este artigo, enquanto escutava a voz intensa de Beto Dias em “Vítima de Paixão”, tive a sensação de que os meus dedos, em vez de teclarem num computador, acompanhavam as teclas de um piano.
Há canções que não são apenas melodias — são estados de alma. E essa canção fala-nos de vazio, de esperança e de compromisso, sentimentos que também atravessam o mundo do desporto.
Assim como na música se confessa que viver sem amor é sentir um vazio profundo, também no desporto viver sem ética e sem valores é cair no mesmo abismo: um campo vazio, uma vitória sem brilho, uma medalha sem honra. Em Angola, 72% da população tem menos de 35 anos.
Somos, portanto, um País jovem, cheio de energia, sonhos e talento. Mas se não formos capazes de transformar esta força em desenvolvimento, seremos como o narrador da canção: apaixonados, mas perdidos; ricos em promessas, mas pobres em realizações.
Foi essa a mensagem que o Ministro da Juventude e Desportos, Rui Falcão Pinto de Andrade, levou a Nova Iorque no dia 25 de Setembro, durante a Reunião de Alto Nível das Nações Unidas sobre os 30 anos do Programa Mundial de Acção para a Juventude.
Angola reafirmou o compromisso de colocar os jovens no centro das políticas públicas, recordando que fomos pioneiros na ratificação da Carta Africana da Juventude. Sem ética, qualquer vitória é frágil; sem integridade, qualquer medalha é suspeita.
É por isso que Angola tem dado passos importantes: a Lei Antidopagem no Desporto, a criação da Agência Nacional Antidopagem, a instituição do Conselho Disciplinar Antidopagem e o PLANADESPORTO 2024–2027. Estes marcos não são apenas documentos — são compromissos com o futuro. E como canta Beto Dias, quando falta aquilo que é essencial, “a noite torna-se fria e vazia”.
No desporto, o essencial é a confiança. E ela só existe quando a gestão é transparente, os processos são claros e os jovens acreditam que o mérito é o único caminho para o sucesso.
Exemplos não nos faltam: o Clube Formiguinhas do Cazenga, que mostrou que a seriedade atrai patrocínios; a Académica do Lobito, que tem fortalecido a formação através de parcerias privadas; ou a reinauguração da quadra Fernando de Sousa, no Vila Clotilde, que devolveu dignidade a jovens atletas. São sinais de que a paixão pelo desporto, quando bem orientada, não cria vítimas, mas sim vencedores.
Como lembra o pensador africano Othman Mezouar, programas desportivos bem estruturados podem ser catalisadores de educação, saúde e inclusão. Em Angola, o desporto deve assumir esse mesmo papel: ser aliado das escolas, espaço seguro para raparigas, ferramenta de paz e coesão social.
O desafio que temos é não permitir que a nossa juventude seja, como na canção, “vítima de paixão” — apaixonada pelo desporto, mas traída por estruturas frágeis e corrupções invisíveis.
O que precisamos é transformar essa paixão em caminho de futuro, em energia organizada e ética para uma África jovem, justa e inspiradora. No fim, o desporto deve ser aquilo que o amor é para Beto Dias: algo sem o qual a vida perde sentido.
Por: EDGAR LEANDRO