Houve um tempo em que o nome “Angola” ocupava as manchetes dos jornais desportivos de todo o continente. Não era por política, nem por notícias de guerra, era pelo basquetebol.
Em plena década de 90 e nos anos 2000, a seleção nacional masculina reinava no Afrobasket, colecionando títulos e conquistando respeito. Num país que saía lentamente das ruínas deixadas por décadas de conflito, aquelas vitórias eram mais do que troféus: eram momentos de união, orgulho e esperança. Como é sabido, não tínhamos abundância.
Reitero, o país ainda se construía das cinzas da guerra… mas tínhamos uma seleção que nos fazia sonhar. Cada ponto marcado era uma pontada de esperança no coração do povo. A cada campeonato, as ruas enchiam-se de sorrisos.
O som das buzinas misturava-se com a batida dos tambores improvisados, e até os mais cépticos deixavam-se contagiar. O basquetebol tornou-se o bálsamo que curava, por instantes, as feridas de um povo cansado da escassez e da incerteza. O grito de vitória ecoava de Cabinda ao Cunene, cruzava fronteiras e chegava a todos os cantos de África.
Era o tempo em que o Afrobasket vestia as nossas ruas de vermelho, preto e amarelo. O apoio do público era, sem dúvida, um dos pilares do sucesso da Seleção Nacional de Basquetebol nesse período.
Nos jogos em casa, os pavilhões enchiam-se muito antes do apito inicial, com uma vibração que contagiava os jogadores. O som dos tambores, as palmas ritmadas e os cânticos criavam uma atmosfera única, que transformava cada partida num verdadeiro espetáculo patriótico.
O público não era apenas espectador: era parte activa da estratégia, motivando e intimidando adversários. Quando o campeonato era fora de Angola, a paixão atravessava fronteiras.
Organizaram-se caravanas de adeptos, que viajavam de autocarro, carro ou até de avião para apoiar a equipa. Muitos faziam longas jornadas, dormindo em condições improvisadas, apenas para estar presentes e mostrar à Seleção que não estavam sozinhos.
Era comum ver bandeiras, camisolas e cartazes a colorir as bancadas estrangeiras, fazendo com que, mesmo longe de casa, Angola parecesse jogar no seu próprio território. Quando a bola voava para três pontos, as bancadas explodiam: “Sacooooo!”.
Era o som da alegria, o som da superação. Eles mostraram ao mundo que a grandeza de um país, não se mede pelo tamanho do seu território, mas pela coragem dos que o representam. Hoje, ao lembrar esse tempo, sentimos saudade… mas também o desafio de devolver ao nosso basquetebol o brilho que, um dia, fez de Angola a alegria e o orgulho de África.
Este ano, no dia 12 de Agosto, por sinal, data do meu aniversário e Dia Mundial da Juventude, começou mais uma edição do Afrobasket. Que seja não apenas o reinício de uma competição, mas a renovação de um sonho.
Que a nova geração se inspire nos gigantes que, um dia, fizeram de Angola a alegria e o orgulho de África. Que nomes como Victorino Cunha, Luís Magalhães e Mário Palma, com este último, Angola conquistou quatro títulos consecutivos do Afrobasket (1999, 2001, 2003 e 2005), além de participações competitivas em Campeonatos Mundiais e Jogos Olímpicos, continuem a soar como referência para as novas gerações de jogadores.
A este, auguro que, nos próximos campeonatos do Afrobasket mantenham o espírito de glória e superação que marcaram o passado. Mas, para isso, é fundamental investir numa preparação de longo prazo.
Isso significa criar um plano estratégico que vá muito além da fase de concentração, envolvendo o acompanhamento contínuo dos atletas, programas de formação de base e a aposta em centros de alto rendimento.
O basquetebol angolano já provou ter talento, porém, para se manter no topo, é necessário que a organização e a estrutura estejam à altura das exigências da competição moderna. Outro ponto crucial está relacionado a renovação e integração de novos talentos.
As gerações de ouro inspiraram multidões, mas o futuro exige que a nova safra de jogadores seja descoberta, preparada e motivada desde cedo. Competições internas bem organizadas, intercâmbios com equipes estrangeiras e estágios internacionais, podem acelerar o desenvolvimento dos jovens. É preciso que eles entrem na selecção com experiência competitiva e mentalidade vencedora.
Essas caravanas e deslocações criavam momentos memoráveis, não só para os adeptos, mas também para os jogadores, que frequentemente destacavam a energia e o calor humano como factores decisivos nas vitórias.
O orgulho nacional estava estampado nos rostos e nas vozes de cada um, criando uma ligação quase espiritual entre equipa e nação. Era mais do que basquetebol: era um movimento colectivo que reforçava a identidade angolana e mostrava ao continente africano a força de um povo unido pela mesma paixão.
Nomes como Jean-Jacques da Conceição, Victor de Carvalho, Ângelo Victoriano, Baduna, Benjamin Avó, Carlos Guimarães, Paulo Macedo, Olímpio Cipriano, Carlos Morais e Miguel Lutonda, Aníbal Moreira, Kikas, Walter Costas e outros… tornaram-se lendas vivas.
Eram heróis que carregavam nas costas, não só a camisola da selecção, mas também os sonhos de milhões de angolanos. Cada cesto marcado contra adversários como Nigéria, Senegal, Tunísia e Egito, era celebrado como se fosse a própria vitória da nação contra o infortúnio.
O Afrobasket não era apenas um torneio: era um palco onde Angola mostrava que, apesar das dificuldades, podia ser a melhor. Era a prova de que disciplina, talento e trabalho de equipa podiam derrotar gigantes e inspirar gerações.
Por: YARA SIMÃO