Acidentes de trabalho em empresas nacionais são um dos temas debatidos por especialistas na área da saúde ocupacional. Mário Tavira, inspector geral do trabalho, afirmou no workshop sobre saúde no trabalho que os números de acidentes de trabalho apresentados por empresas angolanas não reflectem a realidade que se vive no país
No workshop, cujo tema foi “o impacto da saúde no trabalho e a implementação do decreto presidencial nº 179/24 sobre saúde ocupacional em Angola”, o inspector geral do trabalho fez saber que as empresas ocupacionais não fornecem estatísticas reais à Inspecção Geral do Trabalho. Todavia, Tavira deixou claro que a divulgação de dados (reais) de acidentes de trabalho, cujas vítimas são os trabalhadores, é uma prática exigida no decreto presidencial 179/24.
O decreto, por sua vez, foi também um ponto de abordagem no evento que reuniu vários especialistas na área de medicina do trabalho. Lavrado a 1 de Agosto de 2024, o Decreto Presidencial n.º 179/24 aprova o Regulamento sobre o Licenciamento para o Exercício de Serviços de Segurança, Higiene e Saúde no Trabalho (SHST).
Apesar da existência deste, os profissionais consideram a saúde ocupacional como sendo tema ignorado por parte de algumas empresas no país. Sendo assim, Nelma Sambu, directora geral da Clínica Uayele (organizadora do evento), destaca a importância de as empresas implementarem os exames ocupacionais, a segurança no trabalho, a avaliação de risco, as palestras e os primeiros socorros, porque “sem saúde não se consegue trabalhar”.
De acordo com a representante da clínica, apesar de ser ainda um tema recente, em Angola, empresas há que já possuem o serviço de saúde no trabalho.
“Temos as empresas petrolíferas, que cumprem as normas internacionais, as empresas de construção civil, a banca e as empresas do processo alimentício, para além de outras”, frisou.
Numa altura em que Angola se encontra no processo de empreendedorismo, para os profissionais, o objectivo é fazer com que as pessoas cumpram com as normas, que os trabalhadores tenham os seus direitos preservados e que as empresas cheguem ao objectivo de saúde no trabalho.
Segundo apontou Nelma Sambu, na função pública, os ministérios das Finanças, concretamente a Administração Geral Tributária (AGT,), da Defesa Nacional e Veteranos da Pátria, concretamente a Procuradoria Geral da República (PGR) são alguns dos que têm tentado cumprir. “Neste momento, a função pública está no processo de organização e de exame ocupacional”.
Escassez de profissionais em saúde ocupacional
A falta de profissionais formados em saúde do trabalho é também uma preocupação para quem exerce a mesma função. Fruto disso, Telmo dos Santos, especialista em Saúde, Segurança, Sustentabilidade e Ambiente, ainda é escasso o número de indivíduos ligados a esta área. “Isto deve-se, também, ao facto de não haver, em Angola, formação académica para matérias de saúde e segurança no trabalho.
Não há um curso de ensino médio sobre a higiene de segurança no trabalho; não há um curso de licenciatura sobre isso, portanto, esta dificuldade também compromete.
Há, de facto, formações profissionais que, quer o Ministério do Trabalho, quer empresas certificadas de formação profissional, vão dando e que ajudam a criar competências profissionais para pessoas que querem enveredar para isso”, salientou.
Telmo considera a profissão como não sendo ainda muito falada e valorizada no território nacional, pelo que não é respeitada pelas empresas. O cenário é, para o responsável, não muito fácil, pois há maior probabilidade de as empresas montarem o seu plano de negócios com outras áreas, do que com a área da saúde e segurança dos seus trabalhadores, mas, ainda assim, hoje a realidade é muito melhor do que há alguns anos.
Quando questionado sobre a razão de certas empresas não possuírem a cultura que tanto se apela, Telmo afirmou que, dentre os motivos, um é o desconhecimento e a falta de sensibilidade nesta matéria, “daí encontros como estes serem importantes para ajudar e levar a informação às empresas e ao público em geral, que é de fato importante.
Outras empresas temem o investimento nestas áreas, há ainda outras, por dificuldades de pessoas formadas para garantir o preenchimento destas vagas”, retorquiu.
Aproximadamente um ano depois da entrada em vigor do decreto 179/24, os profissionais e actuantes na saúde do trabalho chamam a atenção das empresas, fazendo-lhes lembrar que o investimento no colaborador acaba por refletir-se na maior produtividade e satisfação do colaborador, e, portanto, quanto mais feliz e satisfeito o colaborador está, maior é a entrega e, consequentemente, maior será a produtividade.
É nesta ordem de ideia que os mesmos esclarecem que, quando ocorre um acidente de trabalho, o custo é três vezes maior em relação ao investimento.
“Também se consegue poupar porque um acidente de trabalho acaba por ser mais oneroso, logo, o conselho é que as empresas continuem a investir em saúde ocupacional”, reiterou Telmo dos Santos em apelo às empresas.