A transformação digital deixou de ser uma opção para se tornar uma necessidade na estratégia global. Num contexto de procura pela diversificação económica e modernização, como o nosso, a transição de processos manuais e baseados em papel para modelos digitais assume uma relevância crítica.
Este percurso, além da actualização tecnológica, obriga à reengenharia fundamental dos processos de negócio, à mudança cultural profunda e ao investimento estratégico no futuro.
O estado da transformação digital em Angola revela avanços concretos, mas continua marcado por limitações estruturais. Em Janeiro de 2025, existiam 17,2 milhões de utilizadores de internet (44,8% da população) e 28,7 milhões de conexões móveis activas (74,6%). Mesmo assim, 55,2% dos cidadãos estavam offline.
A conectividade internacional é robusta, mas a adopção interna de serviços digitais pode ser mais rápida e mais efectiva.
Sectores como a administração pública, indústria transformadora, logística, agricultura e MPMEs poderiam beneficiar estruturalmente da transformação digital, deixando de estar ancorados a processos manuais, com impacto directo na produtividade e na competitividade.
Contudo, a jornada digital em Angola é dificultada por um conjunto complexo de obstáculos interligados. Os custos significativos de investimento em tecnologia e acesso a serviços digitais representam uma barreira considerável, particularmente para as MPMEs.
A isto soma-se um défice de competências digitais, tanto a nível da literacia básica da população como na escassez de profissionais especializados, limitando a utilização eficaz das ferramentas disponíveis.
A resistência cultural à mudança, enraizada em processos manuais de longa data, e a necessidade de uma gestão da mudança eficaz são também entraves grandes.
A conectividade fora dos grandes centros continua a apresentar custos elevados e cobertura desigual, ao mesmo tempo que o ambiente regulatório segue em processo de consolidação.
A estes factores somam-se dificuldades no acesso a financiamento e desafios crescentes na cibersegurança, que exigem respostas coordenadas para sustentar a transição digital.
Mesmo assim, o potencial transformador da digitalização é evidente. A eficiência operacional melhora significativamente com a automação de tarefas repetitivas, o que liberta tempo e recursos para funções mais estratégicas, necessárias ao desenvolvimento e crescimento.
A experiência do cliente torna-se mais fluida, com serviços personalizados e respostas mais rápidas. A digitalização permite também ampliar o alcance das empresas, facilita a inclusão financeira e oferece suporte à tomada de decisão com base em dados. Além disso, promove a inovação e incentiva o surgimento de novos modelos de negócio.
O Executivo tem demonstrado empenho no fortalecimento do ecossistema digital, através de políticas e programas orientados para a modernização tecnológica.
A “Agenda de Transição Digital da Administração Pública 2027 – Agenda GOVERNO.AO 27” estabelece objetivos claros para a modernização do Estado e a oferta de serviços integrados.
Investimentos em infra-estrutura incluem a expansão das redes de banda larga e fibra óptica, bem como a maximização das capacidades do satélite AngoSat.
Programas como o Projecto de Aceleração Digital de Angola (PADA) visam melhorar a conectividade e promover o uso produtivo das tecnologias digitais, apoiando start-ups e MPMEs. No entanto, pode existir uma desconexão entre estas iniciativas macro e as necessidades concretas das MPMEs tradicionais que lutam para digitalizar seus processos legados.
Os exemplos que temos de transformação digital mostram tanto os desafios superados como os benefícios alcançados.
Na administração pública, as iniciativas de digitalização integraram serviços, simplificaram processos como a constituição de empresas, e implementaram sistemas de gestão documental, que resultaram em maior organização, transparência e aumento significativo da receita arrecadada.
No sector de telecomunicações, há um forte investimento na melhoria da experiência do utilizador com canais digitais e com o desenvolvimento de serviços financeiros digitais que promovem a inclusão.
A banca que está a passar por uma transformação significativa está a investir em canais digitais, sistemas de pagamentos móveis e instantâneos, explorando formas de alcançar segmentos anteriormente não atendidos. A digitalização tem impacto directo na competitividade.
No mercado interno, começa a assumirse como factor diferenciador, permitindo às empresas reagir com mais agilidade às exigências dos clientes e às dinâmicas do mercado.
No plano internacional, processos digitais facilitam o comércio e o acesso a novos mercados, promovendo a integração em cadeias de valor regionais e globais, condição cada vez mais determinante no posicionamento económico de qualquer país.
A transformação digital estende-se a toda a cadeia de valor, melhorando a articulação entre fornecedores, distribuidores e parceiros.
A maturidade digital do sector privado é também um sinal positivo para investidores e potenciais parceiros estratégicos.
A transição do papel para o digital, além de uma actualização de processos, representa uma mudança estrutural.
Exige visão, investimento continuado e compromisso com uma transformação profunda que reposicione as empresas para competir num mundo em aceleração digital.
Por: FABIANO KLEIN
*Gestor de Consultoria da TIS