Em Agosto de 2019, foi aprovada na especialidade, em Assembleia Nacional, a lei do transplante de órgãos em Angola. Entretanto, apesar de tal lei ser aprovada, desde a data da sua aprovação até a presente data, a mesma não entrou ainda em vigor.
Segundo Suzana Costa, vice- presidente da Sociedade Angolana de Nefrologia, o não exercício dessa lei, aprovada há mais de cinco anos, é fruto de alguns aspectos específicos a serem legislados e alguns mecanismos e estruturas a serem criados.
“Estes aspectos envolvem a criação de uma lista ordenada nacional para todos os doentes selecionados e considerados aptos para transplante e o seu mapeamento de acordo com as compatibilidades; a criação de um laboratório de alta complexidade para análise da compatibilidade para selecionar os órgãos e o receptor do órgão segundo a compatibilidade; selec- ção e credenciamento pela ordem dos médicos de Angola.
Envolvem, para além destes, um colégio de especialidade de nefrologia e a sociedade de nefrologia dos serviços com idoneidade técnico-científica para a realização de transplante renal em Angola; a validação dos protocolos de imunossupressão para o tratamento destes doentes; a regulamentação em relação ao dador (quem pode ser doador) e ao receptor (quem pode ser receptor do órgão) e a criação de uma comissão nacional de ética para fiscalização do processo”, afirma a vice-presidente.
Suzana Costa afirma que os doentes renais em Angola têm enfrentado sérias dificuldades que carecem de resposta imediata, designadamente inexistência de leis de protecção ao doente renal, subsídio de desemprego, protecção ao despedimento por absentismo para comparência no tratamento, comparticipação pelo estado na compra dos medicamentos para as principais causas e a dificuldade no cumprimento das medicações pelas dificuldades.
A nefróloga afirma que, em Angola, estão registados, actualmente, 3722 doentes renais, sendo a faixa etária de 30 aos 50 anos, economicamente activa, a que mais impacta negativamente para o país. Os jovens estão cada vez mais inerentes à doença, tudo por conta do consumo excessivo de sal, de álcool e de outras drogas anabolizantes.
Doentes em Portugal sem apoio do Estado angolano
Em conversa com Gabriel Tchimuco, presidente da Associação de Apoio aos Doentes Renais em Portugal, este informou que a maior parte dos doentes transplantados perdeu o apoio do Estado angolano por terem participado numa manifestação, junto da embaixada de Angola, cujo motivo era a falta de alimentação e de subsídios a que os doentes ficaram sujeitos durante um ano.
O governo terá interpretado mal essa acção e mandou uma Comissão Médica para afastar compulsivamente os doentes em 2018. A associação terá já feito várias petições para que os doentes renais recuperem a sua credencial de junta, mas sem qualquer sucesso.
“Vários compatriotas nossos perderam a vida, por conta de uma medida completamente desajustada, uma vez que em Angola não há condições para o acompanhamento dos doentes transplantados”, disse. A maior parte dos doentes renais que vieram para Portugal, segundo aquele líder associativo, foi por dificuldades de acessos vasculares e agravamento das paratiroides (PTH).
O processo de evacuação passa pela Junta Nacional de Saúde de Angola e, hoje, a demanda de doentes com esses problemas é grande e não tem sido fácil conseguir uma Junta. “A maior parte dos doentes transplantados em Portugal tem um apoio social do Estado português, o que minimiza em certa medida as suas dificuldades. Mas ainda assim, não tem sido fácil para muitos, porque as rendas de casa são muito altas”, sustenta.
Quanto à questão do transplante em Angola, disse que apesar de estarem a levar a cabo o projecto, isso só terá efeito daqui a 5 anos ou mesmo 10 anos, se começassem a tra- balhar agora na sua implementação.
A transplantação de órgãos obriga à regularização da lei, à criação de um centro de recolha de órgãos e de histo-compatibilidade, laboratórios e médicos especialistas em patologia, à formação de quadros para essa área especificamente, etc. Por outro lado, falou também da condição social do doente, que deve também ser levada em conta.