Um grupo de 23 empreiteiras chinesas que prestavam serviço ao grupo China International Found (CIF) em Angola está a reclamar ao Estado por prejuízos avaliados em 285 milhões de dólares, causados com a apreensão dos seus equipamentos em diversos estaleiros pelo Serviço Nacional de Recuperação de Activo (SENRA), e a falta de pagamento por serviços prestados
A revelação foi feita esta quarta-feira, pelo cidadão chinês Li Tongxi, representante das construtoras asiáticas, na audiência de julgamento do Caso CIF, que tem entre os arguidos os generais Manuel Hélder Viera Dias Júnior “Kopelipa” e Leopoldino Fragoso do Nascimento “Dino”.
No momento em que estava a ser ouvido na Câmara Criminal do Tribunal Supremo, na condição de declarante, o gestor declarou que a quantia acima mencionada reflecte tanto o valor dos equipamentos apreendidos alegadamente de forma arbitrária como o valor correspondente aos trabalhos de construção que realizaram nos empreendimentos que passaram para a esfera do Estado.
Entre tais empreendimentos, o destaque recai para o projecto habitacional KK8500, adjacente à centralidade do Kilamba, onde foram apreendidas mais de 1.100 imóveis inacabados (repartido em 271 edifícios e 837 vivendas espalhadas por vários níveis de construção no local), estaleiros e terrenos que se encontravam na posse da empresa CIF Angola.
Além dos imóveis e estaleiros apreendidos na centralidade Vida Pacífica, localizada no Zango Zero, também foram confiscados outros bens na centralidade do Kilamba.
Li Tongxi aproveitou a ocasião para manifestar, em tribunal, que os proprietários das referidas empresas estão preocupados por alegadamente notarem que não há vontade das autoridades angolanas em resolverem o assunto, dado que já recorreram a várias instituições do Estado e não obtiveram respostas favoráveis.
A juíza-presidente da causa, Anabela Valente, advertiu ao declarante que a audiência de discussão e produção de provas em que estava a ser ouvido não era o local ideal para apresentar tal reclamação, pois devia cobrar tais valores à empresária chinesa Madame Lo Fong Hun, esposa do magnata sino-britânico Sam Pa, por ser a proprietária dos referidos bens.
Em reacção ao que acabava de ouvir, o advogado Benja Satula, defensor das empresas Plansmart International Lda e Utter Rigth Internacional Limited, também arguidas no processo, protestou o posicionamento da juíza da causa.
O causídico questionou se tais bens pertencem à aludida empresária chinesa, por que razão o Serviço Nacional de Recuperação de Activos (SENRA), órgão afecto à Procuradoria Geral da República, os apreendeu sem qualquer legitimidade.
De salientar que tais bens, apreendidos, nomeadamente os 52 edifícios na centralidade Vida Pacífica, os imóveis inacabados na centralidade KK8500, os estaleiros e os terrenos existentes nestes dois projectos foram passados para outras entidades.
Empresários Eugénio Neto, Hélder Bataglia e Zandre Finda
Os empresários Eugénio Neto, Hélder Bataglia e Zandre Finda, a deputada Maria de Lourdes Caposso, e o antigo director adjunto do Instituto Nacional de Habitação (INH), Ury Oliveira de Melo Araújo, estão entre as pessoas que foram ouvidas como declarante, esta semana, na Câmara Criminal do Tribunal Supremo, no âmbito do processo-crime que tem entre os arguidos os generais Manuel Hélder Vieira Dias Júnior “Kopelipa” e Leopoldino Fragoso do Nascimento “Dino”.
O cidadão luso-angolano Hélder José Bataglia dos Santos, fundador, presidente e sócio do grupo Espírito Santo Comércio (Escom), foi arrolado a este processo, na qualidade de declarante, por ser a pessoa que apresentou o magnata sino-britânico Sam Pa às autoridades angolanas, “abrindo as portas” do país às suas empresas.
Segundo o Ministério Público (MP) essa relação começou em 2004, quando o então também presidente do Conselho de Administração do finado Banco Espírito Santo Angola (BESA), Hélder Bataglia, foi abordado pelo empresário chinês com o objectivo de adquirir o Banco Espírito Santo, em Macau, com o objectivo de, supostamente, criar uma grande offshore para a África e América Latina.
Para chegar até o líder da Escom, Sam Pa abordou o embaixador de Angola em Moscou, general Roberto Leal Monteiro “Ngongo”, que, por seu turno, diligenciou o primeiro contacto entre os gestores desse grupo empresarial e o seu amigo asiático.
“Hélder Bataglia tomou conhecimento da intenção de Sam Pa e, estabeleceu contactos, a partir de Portugal, com o mesmo”, lê-se na acusação. Depois deste primeiro contacto, Hélder Bataglia comunicou as pretensões e os planos estratégicos dos chineses ao empresário Eugênio Manuel da Silva Neto, à data vice-presidente da Escom Mining em Angola.
Este considerou ser mais uma oportunidade de negócios e conduziu à criação de uma joint venture chamada China-Beia-Escom. As negociações prosseguiram a bom ritmo, o que levou Hélder Bataglia a deslocar-se à China com vista a formalizar totalmente a empresa China-Beia-Escom.
De regresso, comunicou os resultados ao seu parceiro de negócios, Eugênio Neto, que se terá percebido que Angola não fazia parte do leque de países africanos em que Sam Pa alegadamente pretendia investir.
Conforme atestou o MP, para inverter essa situação, tendo em conta que o Governo angolano estava à procura de financiamento para reconstruir o país depois de um longo período de guerra, bem como tentava atrair investidores estrangeiros, Eugênio Neto decidiu dar a conhecer ao então Presidente da República, José Eduardo dos Santos, a pretensão de Sam Pa.
“O declarante Eugênio Neto, por intermédio de um memorando por si elaborado e remetido ao Presidente José Eduardo dos Santos, enfatizava a importância de Angola também poder beneficiar dos investimentos globais de Sam Pa”, lê-se na acusação.
Em função disso, através da Escom, Sam Pa aceitou incluir Angola na sua pretensa estratégia de investimento, condicionando, entretanto, a mesma ao envio do Chefe de Segurança de Estado de Angola à China.