O ataque israelitade 7 de junho de 2025 contra as instalações nucleares de Natanz – o mais devastador desde o assassinato de cientistas iranianos em 2020 – marcou a transição de uma “guerra nas sombras” para confronto aberto.
O Irão respondeu com o primeiro ataque directo contra Israel desde a Revolução Islâmica e o bloqueio simbólico do Estreito de Ormuz (afectando 18% do comércio marítimo global).
Em 2025, o Oriente Médio aprendeu da pior forma que algumas ameaças existenciais não têm soluções militares – apenas gerenciamento de crises. O verdadeiro teste agora é saber se Washington e Telavive entenderão isso antes que o depósito de pólvora exploda de vez.
O desejo secreto de certos círculos em Telavive e Washington – uma vitória militar israelita que implodisse o regime iraniano – é compreensível face à ameaça existencial que Teerão representa. Contudo, sonhar com esse desfecho é como desejar um incêndio controlado num depósito de pólvora.
As consequências geopolíticas de um “sucesso” israelita seriam tão profundas e imprevisíveis que o Oriente Médio emergente poderia fazer o actual parecer um oásis de estabilidade. E a ironia trágica deste conflito é que:
1. Se Israel vencer herda um Irão em colapso com armas nucleares à venda no mercado paralelo;
2. Se o Irão vencer legitima o eixo de resistência desde o Iêmen até Gaza;
3. Se ninguém vencer o conflito é congelado com sanções totais, resultando numa crise econômica global. 1. O Fantasma do Caos Regional (e a Ilusão da Ordem): A queda de Teerão desencadearia não uma primavera democrática, mas um inverno de conflitos sectários e disputas de poder.
O “Eixo da Resistência” (Hezbollah, Houthis, milícias iraquianas) não se evaporaria; fragmentar-se-ia em células armadas desesperadas, transformando o Líbano, o Iémen e o Iraque em campos de batalha ainda mais ferozes.
A Síria, já esquelética, ruiria definitivamente. A falsa promessa? Que a Arábia Saudita ou o Egipto preencheriam o vácuo. Riad, engessada pela sua própria transição frágil e pelo fantasma da rivalidade com a Turquia e o Qatar (ansiosos para expandir o islamismo sunita), não teria capacidade – ou legitimidade – para impor ordem.
Israel, após uma vitória táctica monumental, encontraria um ambiente regional mais tóxico e imprevisível do que nunca, com o ódio anti-israelita a atingir novos patamares históricos.
2. Petróleo: A Volatilidade como Nova Normalidade: A ideia de um Irão pós-revolucionário, pró-Ocidente e bombeando 4 milhões de barris/dia para baixar os preços é um conto de fadas perigoso.
A realidade seria: – Pânico Imediato, pois haveria ameaças ao Estreito de Hormuz (mesmo por grupos remanescentes) e sabotagens fariam os preços disparar para níveis estratosféricos, estrangulando economias globais.
– Instabilidade Permanente, uma vez que a transição seria longa e sangrenta. Quem controlaria os campos de petróleo? Governo provisório? Milícias tribais? Grupos separatistas? A incerteza seria o maior prêmio de risco do mercado.
– OPEP em Frangalhos, isto é, s saída do Irão (2º maior reserva da OPEP) destruiria o já frágil equilíbrio OPEP+, entregando às Arábia Saudita um poder temporário que seria um convite à desunião e a traições entre produtores. 3. Rússia e China: Os Grandes Perdedores (Tácticos) e Aventureiros (Estratégicos) Moscovo perderia seu aliado regional mais crucial, pois o canal para contornar sanções estaria bloqueado. O mercado de armas de alto valor e a influência na Síria seriam severamente comprometidos.
Pior: um Irão produtor e estável inundaria o mercado, derrubando preços e minando o já combalido orçamento russo, dependente do petróleo. A “vitória” do Ocidente seria um pesadelo económico para o Kremlin.
Para Pequim, o Irão não é um fornecedor de petróleo (10% das importações); é a pedra angular da Iniciativa Cinturão e Rota (BRI) no coração da Eurásia. Investimentos de dezenas de milhares de milhões evaporariam e a solução seria tentar realinhar-se apressadamente com a Arábia Saudita e acelerar rotas alternativas (ex.: Corredor China-Paquistão), mas com um custo estratégico imenso e anos de atraso. A humilhação geopolítica seria profunda.
Conclusão: O Preço Proibitivo da Vitória
Sonhar com a queda do regime iraniano por acção militar israelita é subestimar grotescamente a lei dos efeitos colaterais não intencionais. O que emergiria das cinzas não seria um Irão dócil e estável, mas um buraco negro de caos que sugaria toda a região para uma nova espiral de violência sectária, desestabilizaria a economia global através do petróleo e forçaria uma reconfiguração geopolítica traumática para potências como a Rússia e, sobretudo, a China.
A lição do Iraque e da Líbia deveria ser clara: derrubar regimes autoritários em sociedades complexas e fracturadas não abre caminho para a democracia, mas para o inferno.
Israel poderia eliminar um inimigo, apenas para se ver rodeado por um cemitério de Estados falhados e ódios ainda mais radicais. Algumas vitórias são, na verdade, derrotas disfarçadas.
Esta seria a definição de uma Vitória Pirrônica – onde o custo da conquista supera catastróficamente o seu benefício. A região não é um tabuleiro de xadrez onde peças são removidas sem consequências; é um campo minado onde um único passo em falso pode detonar tudo.
Por: ALEXANDRE CHIVALE