Num país que se constrói sob os pilares do Estado de direito, a cidadania começa com o reconhecimento formal da identidade. Em Angola, o Bilhete de Identidade (BI) é mais do que um simples documento – é o instrumento que permite o exercício de praticamente todos os direitos fundamentais consagrados na Constituição. Angola perfila no gráfico de países com maior crescimento da população mundial.
Estima-se que até 2030 a população de Angola chegará no pico de 45 milhões de habitantes. No entanto, essa realidade demográfica impele ao Estado adotar medidas que garantam um acesso massivo aos serviços de identificação, e sobretudo o basilar, que é, neste caso, o BI. É neste quadro que o Executivo, entre outras medidas, promove o programa da “Massificação do Bilhete de Identidade” em todo território nacional.
É uma decisão que visa conferir maior inclusão social dos cidadãos nacionais. É um direito fundamental assistido constitucionalmente. Sem um BI, um cidadão não consegue beneficiar-se dos serviços públicos sem restrições.
Não consegue emprego formal, abrir uma conta bancária, votar ou até registar os seus filhos. Esta ausência institucionaliza é uma exclusão silenciosa e perigosa, sobretudo nas zonas rurais, onde o acesso ao registo civil continua limitado. Isso acarreta consequências securitárias. Outrossim – o acesso restrito aos serviços públicos que conferem a nacionalidade -, dá vazão aos registos de identidade forjada.
O Ministério das Relações Exteriores recebe inúmeras cartas rogatórias de países europeus e latinos reportando a existência de cidadãos angolanos que emigram nas margens dos canais consulares.
Após uma perícia, o dado dramático é que os cidadãos não apresentam traços identitários do país, mas a sua documentação pessoal – nomeadamente BI e Passaporte – ilustram-se autênticos. É por aqui onde se levanta o dilema securitário referido.
O programa da Massificação do BI poderá corrigir essa vulnerabilidade latente. A Constituição da República de Angola é clara: todos são iguais perante a lei (art. 23.º) e têm direito à educação, à saúde, ao voto e à proteção social.
Contudo, esses direitos tornam-se inatingíveis quando o cidadão não tem o reconhecimento legal da sua própria existência. Ter um Bilhete de Identidade não deveria ser um privilégio urbano, mas sim um direito universal e acessível a todos os angolanos, independentemente da sua condição social ou local de nascimento.
É com base nisso – que orientou o pensamento estratégico do Estado angolano em massificar o acesso ao Bilhete de Identidade. A massificação do BI precisa ser assumida como prioridade nacional. Isso implica mais do que campanhas pontuais: exige uma estratégia contínua, descentralizada, inclusiva e apoiada por tecnologia moderna.
É necessário levar o registo civil às aldeias, criar brigadas móveis de emissão de documentos, sensibilizar as comunidades e eliminar os entraves burocráticos que dificultam o processo. Massificar o BI é massificar a cidadania.
É garantir que cada angolano seja visto, contado e ouvido pelo Estado. É assegurar que os direitos não sejam apenas promessas constitucionais, mas realidades concretas na vida das pessoas. Na mesma lógica da medida do Executivo, está a proposta de lei sobre as eleições gerais.
Tão logo for aprovada, o Bilhete de Identidade será o documento único que habilitará os cidadãos exercerem plenamente os seus direitos civis e políticos — entre eles, o direito de eleger os seus representantes.
A massificação do BI representa, assim, um avanço significativo na consolidação da democracia angolana. Sem identidade legal, não há cidadania plena. E sem cidadania plena, não pode haver um Estado democrático de “jure e de facto”.
Por: BENJAMIM DUNDA