Cada pessoa é única e especial, carrega singularidades que a tornam diferente de todas as outras pessoas da terra. Cada um de nós é uma entidade rara e exclusiva. Contudo, alguns grupos sociais possuem características comuns, dependendo da região e do local em que habitam.
Tais características não podem servir de pretexto para a exclusão, baseada, sobretudo, na cor dos olhos. A cor dos olhos, para algumas pessoas, é um factor determinante para o sucesso ou insucesso profissional.
Em determinados círculos, os membros são seleccionados com base no critério da cor dos olhos, podendo, em diversos casos, ser este o único, ou o critério mais relevante e determinante, dando vazão a discriminações contra aqueles que não reúnem tais critérios.
Em muitos sectores, a discriminação da cor dos olhos não aparece com insultos ou gestos óbvios, a sombra da cor veste argúcia e discrição, esconde-se, sorrateiramente, por detrás de sorrisos educados, dos desprezos, do menosprezo, e das famosas decisões técnicas, subtis, mas cruéis.
A discriminação da cor dos olhos é oculta, do tipo que não se ouve, mas se sente, nas entrelinhas, nos cochichos e na ferida silenciosa que se abre e não sara.
Em Angola, a maioria esmagadora da população tem olhos escuros, sendo que apenas algumas outras cores oculares partilham o mesmo território.
Tal facto faz parecer um verdadeiro paradoxo falar da cor dos olhos, sobretudo em determinados círculos. Mas, infelizmente, não é.
A discriminação pela cor dos olhos, normalmente, é mais psicológica, mas tão devastadora como o chicote empunhado pelo capataz raivoso dos séculos passados.
Em determinados círculos, a cor dos olhos manifesta-se nas oportunidades que não chegam, nas promoções que nunca vêm, nos convites que desaparecem, ou nunca surgem, nas listas que sempre esquecem dos mesmos nomes, nos pedidos de audiência rejeitados pelo silêncio, pelo olhar cínico e pejorativo que revela, silenciosamente, o sentimento de repulsa e exclusão.
A discriminação pela cor dos olhos manifesta-se quando se assume, consciente ou inconscientemente, que a competência depende da cor dos olhos. Se estes não forem azuis ou verdes, cria-se todo o tipo de barreiras invisíveis, subtis, mas extremamente eficazes, capazes de destruir a competência e o mérito de qualquer um.
Atacam à socapa a tua reputação, afogam os teus méritos, matam os teus sonhos, organizam-se em associações criminosas, unicamente para te eliminar profissionalmente, devido a cor dos teus olhos.
Frases abstractas e eliminatórias como: “não tem o perfil” ou “ainda não está preparado” ou “angolano cabeça água”, ditas com convicção, mas sem justificação ou sustentabilidade concreta.
A cor dos olhos, associada ao perfil, muitas vezes, é um molde desenhado por alguém cuja história o isentou da necessidade de ter de lutar para ser ouvido.
O que significa estar “preparado”, quando é a cor dos teus olhos que irá determinar a tua inclusão ou exclusão? A verdadeira sombra da cor dos olhos aqui é mais impercetível.
A cor dos olhos pode determinar o que serás e que posição ocuparás em determinados círculos. Tais discriminações não são gritadas, não geram escândalos ou revolta, elas apenas são vividas diariamente, por quem vê na cor dos olhos o factor decisivo para a evolução do outro.
A discriminação não se manifesta unicamente com insultos, mas, sobretudo, quando se esconde nas oportunidades negadas, abrindo uma ferida silenciosa, mas dolorosa.
A cor dos olhos é a chave para o acesso a certos círculos ou posições de destaque. Quem tem olhos claros, em princípio, aparenta ter uma vantagem comparativamente a quem possui olhos escuros.
Em alguns sectores, determinadas posições são ocupadas, não por quem tem a melhor competência técnica para o fazer, mas por quem possui os olhos mais claros, e de preferência verdes ou azuis.
Ter olhos claros permite ter maior aceitação e é sinónimo de competência e confiabilidade, usufruir dos melhores salários, das melhores regalias e benesses.
Em sectores restritos e fechados, em empresas privadas, em determinados organismos e organizações, ter olhos claros é o passaporte para patamares e posições de topo.
A cor dos olhos pode ser o requisito fundamental para singrar, mesmo quando apenas isso é o único elemento que o candidato possui. Vezes há que a competência nas mãos de alguém de olhos escuros é negligenciada.
Há quem sofre com adjectivos que lhes são atribuídos, visando unicamente desvalorizar o mérito de quem é competente e capaz, e, por possuir olhos da cor da noite, torna-se de imediato “persona non grata”.
A escuridão dos olhos, em alguns círculos, é quase que um pecado de “lesa-pátria”, mesmo onde a maioria da população é de olhos escuros.
Ser competente e capaz, possuindo olhos escuros, não tem qualquer peso ao lado do incompetente e incapaz que possui olhos claros, pois este último é imediatamente projectado para o alto dos céus. É assim na grande maioria dos casos. Incrivelmente.
O complexo de superioridade de alguns iluminados de olhos claros impinge desigualdade de tratamento, discriminação, e agrava-se quando grupos organizados favorecem premeditadamente um grupo em detrimento de outro.
Cometários e atitudes pejorativas em relação à imagem do próximo constituem máscaras que escondem acções comparadas ao racismo.
A cor dos nossos olhos não pode ser factor de exclusão, pelo contrário, a sua diversidade é uma riqueza cultural e nacional, todos juntos somos poucos para construir esta grande e bela nação.
Unidos, devemos quebrar esse mal silencioso que nos separa e impede que cada talento angolano tenha, por mérito, as mesmas oportunidades para florescer, sem se preocupar com a cor dos olhos.
Este texto é uma homenagem para todos os angolanos que, dia após dia, enfrentam o ambiente de trabalho com dignidade, mesmo quando são alvos de injustiça, preconceito, bullying laboral ou exclusão pela cor dos olhos.
Por: Osvaldo Fuakatinua
Obs.: isto não é sobre olhos.