Foi em finais da década de 80 que o desaparecimento de uma pequena quantia de dinheiro numa família conhecida acabou por criar um certo alvoroço.
Inconformados com o sucedido, um dos integrantes achou por bem recorrer aos ditos adivinhos para que ajudassem a encontrar quem tivera as mãos largas e, com isso, permitir que a maquia sumida ainda pudesse suportar algumas despesas no lar.
Fruto de algum desconhecimento, o familiar que procurara por auxílio no mundo do obscurantismo regressou ao lar com uma vela, com instruções de que, depois de derretida, em plena madrugada, o autor do furto se iria manifestar e apresentar o valor subtraído.
Conta quem acompanhou o episódio que a vela derreteu todinha, há cerca de 40 anos, o dinheiro não apareceu nem tão-pouco o autor da proeza, que, por um pouco, poderia destruir mais um lar de tão furioso que ficou um dos integrantes que era contra o recurso a este tipo de práticas.
Os anos se passam, mas ainda assim a prática permanece. Distante do tempo em que a mensagem era passada boca-a-boca, hoje, muitos destes adivinhos têm palco em páginas de jornais, programas de rádio e, como está na moda, em podcasts e outros espaços que se proliferam nas redes sociais.
Quanto menor o nível de desenvolvimento, maior também são as hipóteses de a população de um determinado país ser penetrada pelos chamados profetas que pregam a teologia da prosperidade e charlatães que se fazem passar por adivinhos ou líderes espirituais. Angola tem sido desde muito um palco fértil.
O número destes indivíduos que dizem ter acesso ao além vai atingindo proporções alarmantes, não só nas suas cidades periféricas, como até naqueles espaços em que se pensava ser de gente mais nobre e instruída.
Se uns se apresentam como tal, isto é, adivinhos ou curandeiros, outros o fazem escudados em seitas cujas acções desestruturam famílias, mutilam pessoas e agravam ainda mais as condições de vida daqueles que até têm muito menos.
É contra estes que o arcebispo de Saurimo, Dom José Manuel Imbamba, lançou um forte apelo no sentido de as autoridades angolanas criminalizarem a actividade de curandeiros, adivinhos e videntes que vão influenciando negativamente a vida das comunidades do país.
O líder religioso defende que “devemos nos libertar dos mitos e falsidades que nos fazem acreditar que a morte é sempre causada por alguém.
A nossa sociedade deve tornar-se uma sociedade do conhecimento, da ciência e da razão”, ressaltando que “já não podemos cair na armadilha de pensar que uma boneca ou um objecto nos dá vida, riqueza ou fama. Essa mentalidade ultrapassada tem de ser combatida”.
A verdade é que, apesar dos anos, ainda escutamos muitos relatos de gente, até bem-sucedida, que ainda acredita em muitos misticismos e acções que acabam por perigar ainda mais as suas vidas.
Agora, resta saber se haverá da parte da sociedade e das autoridades a atenção para que se aceite o repto lançado pelo arcebispo de Saurimo.